Nesta sexta-feira, 14 de abril, o grupo californiano Metallica lançou “72 Seasons”, seu 11º disco de estúdio. Seja por motivos comerciais ou criativos, temos mais um disco competente, porém relativamente desnecessário do Metallica. Mas vale a pena lembrar como chegaram até aqui.
Vinte anos atrás, o Metallica lançava “St. Anger” (2003), seguramente o ponto mais baixo de sua carreira. Para se recuperar daquele abismo criativo e comercial, fizeram algumas mudanças essenciais: voltaram a usar o logotipo clássico da banda e retornaram aos elementos musicais mais comumente associados à fase áurea de sua discografia – músicas pesadas e extensas, solos de guitarra e no máximo uma balada por disco (desde que tenha um bom solo).
Essa fórmula rendeu “Death Magnetic” (2008), um álbum infinitamente superior ao que o antecedeu, mas apenas passável num contexto geral. Poderia ser um ponto final na discografia de estúdio do Metallica, pois o grupo havia provado que ainda conseguia criar músicas respeitáveis, e tranquilamente sustentaria mais uma ou duas décadas de turnês apenas com seu material antigo.
Oito anos se passaram e a banda lançou “Hardwired… to Self-Destruct” em 2016. Era outro trabalho gigantesco, de mais de 70 minutos, outra vez focando nos elementos clássicos do som da banda, sem se arriscar. Competente, aceitável, e fatalmente esquecível quando comparado a um “Master of Puppets” (1986).
Com isso, conseguiram lançar dois discos decentes em seguida, sem inovar (nem estragar) seu som. Eles nem precisavam de mais material para seu repertório, mas o disco até trazia uma ou duas músicas que mereciam estar ao lado dos clássicos, de vez em quando, quem sabe como raridades de setlist. Não havia mais nada para o Metallica provar.
No entanto, não ter algo a provar não impede o Metallica de trabalhar. Sete anos se passam e chegamos a este 2023, em que recebemos mais um disco enorme, previsível e meramente aceitável: o “72 Seasons”. É exatamente tão bom ou ruim quanto os dois que o antecedem, dependendo do seu ponto de vista.
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Na maioria deste disco novo, a banda está inabalável em sua zona de conforto, fazendo o som que melhor sabe fazer, e não tem nenhum motivo para sair de lá. Não há qualquer necessidade para ousarem ou arriscarem, pois não há garantia de que algo bom vai sair disso – mas há a garantia de que 12 músicas novas com uma capa legal vão render muitas aparições na TV e ingressos vendidos para seus shows (que já vendiam maravilhosamente sem esse disco, mas enfim).
Veja bem, nada disso significa que “72 Seasons” seja ruim. É apenas um álbum “comum”, a comprovação de que o Metallica entrou no “modo AC/DC” e achou a fórmula para lançar trabalhos novos sem causar emoções excessivamente negativas ou positivas em seus fãs. São 77 minutos de músicas que qualquer ouvinte casual da banda pode deixar tocando no fundo e não se sentir incomodado em momento algum.
Mas algumas faixas merecem ser citadas.
– “Crown of Barbed Wire” foge do padrão do disco e indiscutivelmente se torna o seu maior destaque. É a única que fará o ouvinte casual parar e prestar atenção nos riffs que estão saindo de seu equipamento de som, recuperando pelo menos um pouquinho da criatividade da melhor fase do grupo.
– A faixa-título “72 Seasons” segue a tradição de sempre haver uma boa faixa de abertura, mesmo nos discos menos notáveis do Metallica.
– Outro destaque, porém menor, é “If Darkness Had a Son”, que tem uma letra um tanto cafona, mas impressiona com seus solos. Não deve ser coincidência que essas três músicas estão entre as quatro que o guitarrista Kirk Hammett ajudou a compor para “72 Seasons”, após ter composto exatamente 0 (zero) em “Hardwired” – supostamente ele tinha perdido o iPhone em que registrava suas ideias musicais. Esperamos que ele tenha descoberto o iCloud.
– Felizmente, a faixa que encerra o álbum também é uma de suas melhores. “Inamorata” força um pouco a barra com 11 minutos de duração, alguns dos quais são maçantes, mas segue o costume que a banda tem de também fechar seus discos com músicas acima da média.
Seria legal se o Metallica ousasse e tentasse recuperar não apenas o som e o logotipo, mas a atitude e a subversão de sua fase áurea, elementos que estão em falta para eles há décadas.
Para saber exatamente o quão necessário “72 Seasons” é para o repertório deles, sugiro ver os setlists de sua última turnê e verificar quantas músicas de “Death Magnetic” e “Hardwired” sobreviveram ao passar dos anos.
(Spoiler: as respostas são, respectivamente, zero, e uma.)
Abaixo, o vídeo ao vivo de “If Darkness Had a Son”, em performance de ontem à noite no programa do Jimmy Kimmel, na TV americana, mais o vídeo oficial de “Sleepwalk My Life Away”, lançado agora de manhã.