Outro álbum importantíssimo a sair por estes dias foi o do fera indie canadense Mac DeMarco, o disco do melhor nome simples dos últimos tempos: “Guitar”. O trabalho vai ser responsável pela nova vinda de DeMarco para o Brasil, trazido pelas mãos da Balaclava Records para nove shows em 14 dias em abril do ano que vem, a maioria deles já esgotada.
O colaborador Richard Timoner, assim que o álbum saiu, levantou os dois braços para a Popload dizendo “Esse eu faço a resenha”, esta que está aqui embaixo.
Como se trata de um adorador de Marc DeMarco, achamos melhor não se indispor. Fora que, como seguidor do canadense, ele tem muito a falar.


Depois de chocar o mundo indie lançando um álbum composto por 199 faixas em 2023, o canadense Mac DeMarco voltou com “Guitar”, um disco “normal”(12 faixas), muito mais sóbrio e introspectivo, mas que não deixa de mostrar a essência de um compositor eternamente reflexivo, apaixonado e cada vez mais confiante.
“Guitar” marca definitivamente um novo passo na carreira do cantor. Vale lembrar que, se você está esperando timbres malucos, letras cômicas e aquela clássica despretensão que colocou DeMarco em evidência no cenário mundial, recomendamos que você volte para os álbuns mais antigos, pois já faz alguns anos que suas músicas têm se encaminhado para arranjos mais calmos, concisos e minimalistas. E seu mais novo lançamento com certeza segue nessa direção.
“Guitar” é, antes de tudo, uma volta para casa. Em entrevista à rádio australiana Triple J, o cantor contou que o projeto surgiu em um momento em que retornou para sua casa em Los Angeles, após uma viagem de moto pelos Estados Unidos. Tudo foi produzido em duas semanas, e as gravações são, em sua maioria, demos, o que traz um ar puro e autêntico ao projeto. Mas chega de contornos. Vamos direto ao que importa.
A primeira faixa, “Shinning”, já dá o tom do que está por vir. Uma bateria acústica crocante, deliciosamente gravada, lenta e marcada. Um violão de aço colado ao ouvido, permitindo que ouçamos o deslizar dos dedos nas cordas. O baixo, groovado como de costume. E, surpreendentemente, a voz de Mac DeMarco em falsete, bem sussurrada.
Essa é a fórmula que se repete ao longo do disco. Simples, mas delicioso de se ouvir. Letras românticas, delicadas e reflexivas. Como dissemos, Mac está mais minimalista do que o costume. Nada de timbres malucos. Muita tranquilidade. Nada de assustar a vizinhança.
Aquele ar de demo se mostra presente no fim de músicas como a segunda faixa, “Sweeter”, em que não há corte. O público ouve Mac largar as baquetas da bateria e encerrar a faixa como se estivesse gravando ao nosso lado. Como revelou em recente entrevista ao jornal “The Sydney Morning Herald’, para ele assumir que as faixas são demos é um alívio. Isso porque, logo antes de gravar “Guitar”, Mac passou um mês produzindo um álbum de 14 faixas que foi jogado inteiramente no lixo.

Apesar de gostar das canções que gravou neste projeto descartado, o cantor revelou que estava apenas “abrindo a torneira para limpar os canos da composição”. Ao longo do processo, foi ficando muito minucioso e exigente com o resultado: “Gravei as vozes várias vezes. Fiquei completamente maluco”.
Então, percebeu que estava “perseguindo a perfeição em algo que é inerentemente imperfeito”. E concluiu que a verdadeira força dessas músicas estava justamente em suas versões originais, e, por isso, quando desistiu do projeto e resolveu começar “Guitar”, assumiu que iria trabalhar exatamente com as demos.
Na terceira faixa, “Phantom”, entram maiores efeitos de vibrato no violão, e a partir da quinta faixa, “Terror”, o ambiente começa a se transformar. Se antes o violão era predominante, afinal o nome do álbum é “Guitar” (forma pela qual os norte-americanos se referem ao violão), entra em cena um novo personagem: a guitarra (para eles, eletric guitar). Sempre meio torta, daquele jeito que Mac gosta de fazer. Fomos inclusive surpreendidos com um extenso solo na sexta faixa, denominada “Rock and Roll”, que termina comicamente com um improviso completamente descontrolado, mostrando que o humor desleixado do músico continua lá.
Depois vem “Home”, o primeiro single lançado do trabalho. Aqui, entramos em um nível mais profundo dos sentimentos de Mac, e entendemos que retornos para casa nem sempre são fáceis, apesar de não saber se ele se refere a sua casa de Los Angeles ou ao Canadá. O vídeo da música mostra DeMarco remando tranquilamente por um lago canadense. E na entrevista já mencionada à “Triple J”, ele revela também como muitas vezes se sente um outsider em seu país de origem, por ter passado grande parte da sua vida morando nos Estados Unidos.
Na faixa seguinte, “Nothing at All”, o assunto tratado é a sua jornada na sobriedade. Nos últimos anos, o cantor deixou de fumar e beber, e revela nesta canção as dificuldades de lidar com esse processo. Aliás, essa será sua primeira turnê 100% sóbria, e muitos se perguntam se a postura do cantor, conhecido por suas performances malucas, irá mudar nos palcos. Mas sabemos que com ele a zoeira é sempre garantida.
Caminhando para o fim do disco, destacamos a também lançada previamente como single, “Holy”, que nos remete a clássicos de sua carreira como “Chamber of Reflection”, tratando de temas mais simbólicos e místicos. A forma como o cantor entoa o refrão com a voz mais grave dá aquele gostinho de comicidade que tanto admiramos em suas interpretações.
Por fim, a última faixa “Rooster”, que trata sobre o desgaste de uma relação, traz um coro sinestésico novamente em falsete, que não pode deixar de nos lembrar do icônico refrão do hit “Salad Days”.
“Guitar” é, afinal, um trabalho maduro e confiante de um artista que nunca se contenta em ficar parado. Sem medo de ser simples e direto ao ponto, mas sempre com muito sentimento e delicadeza. Tudo isso na sua cara, em 2026. Para quem já garantiu o ingresso, claro!