Top 50 da CENA – O shoe-carnaval do Terraplana. O pagodão da Charanga do França. O prometido à Marina Melo

Contrariando o previsto, até que o pessoal trabalhou bastante antes do Carnaval. Tivemos muitos lançamentos. Mas aí chegou a semana da festa e (quase) todo mundo resolveu não competir com a folia. Ainda assim, encontramos algumas coisinhas novas para te mostrar. E uma coisa sobra a banda Terraplana. Essa é a terceira vez que eles entram no topo do nosso ranking ou é impressão?

Lógico que a banda paranaense Terraplana, que está embarcando para tocar por estes dias no festival-vitrine South by Southwest no Texas para representar o indie brazuca, apareceu com novidades em pleno Carnaval. “Amanhecer”, inclusive, com propriedade, surgiu na manhãzinha de quinta-feira. Um dia bem apropriado para versar sobre não ver o amanhã – um contraste interessante essa noite eterna com o instrumental superlimpo da faixa. “Natural”, segundo álbum do Terraplana, sai na semana que vem, com eles em Austin, mas nós bem aqui, ouvindo.

A Charanga do França já se estabeleceu como atração certeira no Carnaval de São Paulo. Pouco antes de ir para a rua, o grupo liderado por Thiago França soltou esse EPzinho com temas inéditos e uma releitura para “Retalhos de Cetim”, de Benito Di Paula. A ideia era ser um aquecimento para a festa, mas também serve de trilha sonora para o pós – embora quem é de Charanga saiba que não exista pós-Carnaval. Sempre é Carnaval.

Os prédios prometem o céu, mas acabam tirando a visão das estrelas de quem tenta ver o infinito do chão. Paulistana que só, Marina Melo sabe bem disso e resolveu versar sobre o tema em “Prometeu”. Relacionando a febre imobiliária com o mito de Prometeu fez uma canção de ninar. Produção afiada de Luiza Brina e direção vocal da Lio do Tuyo. De quebra, a faixa traz Maurício Pereira vendo o céu via emoji. Às vezes é o que sobra. 

Olha que novidade deliciosa. Quando o Terno Rei subir no palco do Popload Festival, lá no dia 31 de maio no Ibirapuera, já estaremos bem habituados com um disco novinho de uma das bandas indies mais queridas da CENA. Ale Sater, Bruno Paschoal, Greg Maya e Luis Cardoso chegam ao quinto disco de inéditas – mantendo a média de um álbum novo a cada três anos mais ou menos. “Nada Igual” e “Viver de Amor” são os primeiros singles e trazem dois lados conhecidos do grupo, porém turbinados. “Nada Igual” representa as mais velozes, intensas e nostálgicas. Já “Viver de Amor” é a lentinha da vez, lembra Wilco e não deixa de ser também bem intensa, como entrega os versos “Pra viver de amor/ Vou morrer de amor”. A voz dobrada de Ale Sater, por exemplo, dá um grave todo novo à sonoridade. E o vídeo da música é uma belezinha só, uma mistura de “Intriga Internacional” com “Cães de Aluguel”.

Tem uma cena na antiiiiiga novela “O Clone” onde Vera Fischer, a atriz, salva uma festa de virar um barraco completo com uma sugestão: “Vocês querem ouvir uma música bacana? Toca um techno aí!”. Era a senha. Se foi isso que inspirou a turma de Niterói do Vera Fischer Era Clubber ainda não sabemos. Mas combinaria bem com o humor peculiar do quarteto e seu electro-punk-experimental-trash-pop de teclados góticos, baixo pesado e uma bateria eletrônica sem medo de transitar entre o funk e o industrial. O vocal é spoken word. Crystal Duarte recita letras que pegam na veia um linguajar do agora, ideia e palavras que ainda não foram flagrados nem pelas redes sociais. É o agora do jovem em prosa e verso e muita ironia e deboche. Pesquise por “vera fischer era clubber” no YouTube e tudo que encontrará são alguns vídeos postados no perfil donniedarko73 da banda tocando em plena rua no Rio de Janeiro, no festival Novas Frequências. É um Rio que não tá na TV. Soturno. Não vamos falar que parece São Paulo para não ofender. A plateia canta tudo, um monte de músicas que ainda não foram nem sequer lançadas – “Fantasmas” é o primeiro single da vida deles. A  primeira aposta da Palatável Records, da curadora-agitadora Natália Lebeis, promete bem. 

O que o artista deixa de mostrar é tão parte da obra quanto aquilo que vemos. Daí que é um barato uma hora ter acesso ao que poderia ser ou ao processo do resultado final. É isso que o fino Apeles quer mostrar no triplo “2015-2022: The Complete Demos and Early Recordings”, que vai reunir demos e mixagens alternativas dos três álbuns solos do especialíssimo músico Eduardo Praça até aqui. “Mandrião (Vida e Obra)” é a primeira mostra da novidade. Uma elegante reflexão sobre coragem: “Sinto lhe dizer: o medo é filho dos tolos”. E embora carregue o subtítulo “Demo 2” soa completamente pronta. Por que será que ela não coube em “Estásis”?

Fortificando suas boas conexões dentro do continente, Larissa Conforto, aka ÀIYÉ, soltou um single em parceria com o colombiano Juan De Vitrola. A faixa é puro creme, uma canção apaixonada, mas uma paixão com gostinho amargo – o lance já acabou, só existe em lembranças espalhadas por objetos pela casa. Que dor. O telefone toca, mas a outra pessoa se recusa a atender.  

A dupla de compositores Ronaldo Bastos e César Lacerda conseguiu tirar Nina Becker de seu longo hiato musical para cantar uma marchinha da dupla. Coisas que só o Carnaval é capaz de fazer. Na deliciosa brincadeira arranjada pelos craques Guto Wirtti e Marcelo Costa, um clássico imediato para tocar em matinês ou em casa antes de ir para a rua.

1997 é o ano de nascimento de Dadá Joãozinho. Agora também é o nome do novo EP do cantor, produtor musical e multiinstrumentista de Niterói. Em “1997”, Dadá amplia as várias facetas já apresentadas no excelente “Tds Bem Global” (2023). Reaparecem seu gosto por recortes e edição intensa, mas também tem espaço para o primeiro take, o violão – uma abordagem quase lo-fi. “De Qualquer Forma É Grande (Subindo em Árvore)”, por exemplo, se aproxima de um fluxo de consciência amalucado. Já em “Olha para Mim”, parceria com a banda Raça, ele soa rádio-rock como nunca antes. Todos os caminhos são possíveis para Dadá. “As Coisas”, que traz a voz da carioca Jadidi, é uma proposta do que pode ser uma MPB radiofônica sem precisar ser óbvia. 

O riff de guitarra é quase emo, poderia ser também de uma música tristinha do Charlie Brown, mas o resto é puro Wesley Safadão. Essa é a mistura proposta por Getúlio Abelha no forró maluco e bem-humorado de “Toda Semana”, uma ficção daquelas imaginadas alta noite no banheiro de um botequinho sujo. “O forró mais cruel que eu fui foi hoje”, diz o artista piauiense/cearense em um dos versos da música. Se tocasse forró no mundo de “Blade Runner”, seria mais ou menos assim como Getúlio o desenha.  

11 – Siba – “Máquina de Fazer Festa” (com Ronaldo Souza) (9)
12 – Gabriel Ventura – “Fogos” (11) 
13 – Jovens Ateus – “Passos Lentos” (12) 
14 – Josyara – “Ensacado” (com Pitty) (13) 
15 – Cajupitanga e Arthus Fochi – “Dia Santo” (14) 
16 – Nyron Higor – “São Só Palavras” (15) 
17 – Marcelo D2 – “A Maldição do Samba” (16) 
18 – BK – “Só Quero Ver” (com Evinha) (17)
19 – Celacanto – “Cedo” (18) 
20 – Jamés Ventura – “Noites de SP” (19)
21 – Superafim – “Sorry” (20)
22 – Sophia Chablau e Felipe Vaqueiro – “Nova Era” (21) 
23 – Heal Mura – “Wu Wei” (22)
24 – BK – “Só Eu Sei” com Djavan e Nansy Silvvz (23)
25 – Tátio – “Longe De Mim” com Zeca Baleiro (24) 
26 – Jéssica Linhares – “Samba do Sonhador” (25) 
27 – Julia Mestre – “Sou Fera” (26) 
28 – Rei Lacoste – “Sem Paz” (27) 
29 – Menores Atos – “Pronto pra Sumir” (29)
30 – Panteras Venenosas – “Ai Que Saudade” (30) 
31 – Igor de Carvalho – “Pra Te Esquecer” (31) 
32 – BaianaSystem – “A Laje” (32)
33 – Maré Tardia – “Já Sei Bem” (33)
34 – Bem Gil – “Sobe a Maré” (com Domênico Lancellotti) (34)
35 – Thiago França e Rodrigo Brandão – “Young Lion” com Sthe Araújo e Edgar (35)
36 – Tasha & Tracie, Emcee Lê – “Randandan” com Delli Beatz (36)
37 – B.art – “Nêgo/Correnteza” (37)
38 – João Gomes e Gilberto Gil – “Palco” (38)
39 – Vitor Milagres – “Um Barato” (39)
40 – Bruno Berle – “Te Amar Eterno” (40)
41 – Negro Leo – “Me Ensina a Te Castigar” (41)
42 – Tássia Reis – “Sol Maior” (42)
43 – Maria Beraldo – “Colinho” (43)
44 – Thalin, VCR Slim e Cravinhos… – “Todo Tempo do Mundo” (44) 
45 – Supervão – “Androids” (45)
46 – Liniker – “Me Ajude a Salvar os Domingos” (46) 
47 – Paira – “O Fio” (47)
48 – Dora Morelenbaum – “Venha Comigo” (48) 
49 – Amaro Freitas – “Viva Naná” (49) 
50 – Hoovaranas – “Fuga” (50)

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* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, a banda Terraplana, de Curitiba.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro Vinícius Felix.