Top 50 da CENA – O diferente Nyron Higor em primeiro. A maldição de Marcelo D2 em segundo. E o BK só querendo ver, em terceiro

Ressignificar os sons, mexer com o mundo. É algo em comum que todos os artistas em destaque da semana guardam. Se a ordem é velocidade, querem calma. Se o significado tá vazio, preencher com sentimentos reais. Discos para ouvir com tempo. Anda sem? Eles criam.  

Se a ansiedade é a tônica dos nossos dias, o alagoano Nyron Higor quer inverter isso. Seu segundo álbum, que leva o nome do artista, joga o astral para a tranquilidade. Produção compartilhada com seus camaradas Bruno Berle e Batata Boy, as faixas são divididas entre temas instrumentais curtos e canções idem. Um dos baratos aqui é o material deixar os timbres falarem mais alto que as melodias, que não deixam de ser belas, mas vão jogar sabiamente recuadas, em função do time, para ficar na analogia com o futebol. Nyron parece ser virtuoso na calma, no menos. Mas longe de ser minimalista. Em resumo, discão. Diferente. 2025. 

Marcelo D2 não cansou da busca pela batida perfeita, mas renomeou a pesquisa. Desde “Iboru”, lançado em 2023, a procura é pelo tal do novo samba tradicional. Um nome que Marcelo arrumou ao trocar a ordem dos fatores na sua forma de compor. Não é mais rap com elementos de samba. Agora é samba com elementos do rap – samba com grave mais forte, deixa de ser sample e passa a usar sample. É mais ou menos por aí. Nessa pesquisa, o novo TCC de D2 é um resumo da ópera: “Manual Prático do Novo Samba Tradicional  usa a nova lógica para revistar clássicos do samba (“Maneiras”, “Delegado Chico Palha”, “Nascente da Paz”) e do seu próprio material (“A Maldição do Samba”, “Desabafo”). Exige bons fones para uma experiência completa. Se pá, o lance é ouvir no carro. Alguém dá uma carona aí? Tamo chegando com o disco novo do D2. 

A gente já falou um pouco de “Diamantes, Lágrimas e Rostos pra Esquecer” por aqui, mas é preciso falar mais. Como não pensar no álbum sem pensar no efeito Evinha? Dois samples da cantora aparecem no disco (em “Só Quero Ver” e “Cacos de Vidro”) e são de longe o material mais compartilhado da obra nas redes sociais. O fenômeno não é por acaso. Ao recortar a voz de Evinha do samba “Só Quero”, faixa do seu álbum “Cartão de Postal”, de 1971, e colar em uma base mais melancólica, mais grave e nostálgica, BK e Deepakz parecem ter encontrado um lugar perdido no coração de geral. Na música pop, não é preciso dar só espaço para festa ou dor de corno. Ainda cabe falar de dor de amor com elegância.

E, se cabe falar de partida com elegância, também cabe falar do encontro da mesma forma. E é assim que o Celacanto, banda formada por Eduardo Barco, Giovanni Lenti, Matheus Costa e Miguel Lian – sim, ele é irmão da Luiza -, se apresenta ao mundo. “Cedo” é o primeiro single deles, que já roda ao vivo pela CENA. É uma ode bonitinha aquele momento de “Mesmo com tudo diferente/ Veio meio de repente/ Uma vontade de se ver”. Brilha em especial a guitarra com som de sintetizador. Quem já ouviu o disco completo jura que está lindo. Olho neles. 

Ouvir Jamés Ventura é ter uma aula de rua, de saber como as coisas realmente são, de como o papo realmente anda. Fora que seus versos não são de graça: cada linha esconde mais um significado, um artigo raro em tempos tão literais. Por isso que no underground do rap brasileiro não tem mistério: ele é o cara. Um dos poucos que pode nomear um álbum como “Em Nome das Ruas” sem ser cobrado depois.

No ranking passado, também em alto posto, trouxemos aqui uma música da nova banda Superafim, nada mais é que a junção em dupla de dois ex-CSS, Adriano Cintra e Clara Lima, usando como batismo o nome de uma canção famosa de seu antigo grupo. A música, “Dallas Winston”, foi um lado B achado no Youtube do single “Sorry”, lançado oficialmente hoje como, agora assim, o pontapé inicial do projeto. E que estreia. Se as rádios brasileiras mostrassem mais decência com a música nova, “Sorry” tocaria nos melhores horários, como um verdadeiro hit que é. Com toda essa concepção pop, levada por uma guitarrinha indie contínua maravilhosa e toda a engenharia sonora certeira de Adriano, um pedido de desculpas desses saído da boca de Clara é algo para perdoá-la seja lá qual for o crime que ela cometeu.

O Brasil tem uma nova dupla para chamar de sua. Sophia Chablau e Felipe Vaqueiro se trombaram numa turnê que reuniu suas bandas, Tangolo Mangos e Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo (SP), e dali saiu uma boa amizade. Agora, juntos com uma supercozinha formada por Marcelo Cabral (baixo) e Biel Basile (bateria), vemos os primeiros frutos musicais da parceria em um single duplo “Nova Era/Ohayo Saravá”. As duas são ótimas, mas nos pegou de jeito estan“Nova Era”, que é de Sophia e tem uma letra muito boa reunindo todas as frases clichês de término de relacionamento. Seria óbvio, se não fosse Sophia. Ao juntar tantos lugares comuns, todos os becos sem saída do amor, chegamos numa canção superoriginal, um hino de término daqueles – será que alguma dupla sertaneja ousaria regravar esta? Ou seriam Sophia e Felipe a própria dupla caipira que precisamos? Questões. Ah, antes que os fãs de assustem, eles se apressam em avisar que os projetos principais seguem normal. 

Ex-orquestrador sonoro da incrível e hoje extinta Aldo, The Band, Murilo Faria, o Mura, ou Heal Mura como se auto-batizou, achou em projeto solo uma cura sonora para alguns de seus problemas. E, talvez, para alguns problemas da música em si. Mura lançou nesta sexta-feira seu primeiro álbum sozinho, o “The Limited Repetition of Pleasure”, que de uma certa forma o coloca de novo no caminho musical de onde ele nunca deveria ter saído ao mesmo tempo que traz de volta uma certa inteligência há alguns anos na rota da música eletrônica com cara de indie (ou o contrário). Um exímio pesquisador de sons, com “The Limited Repetition of Pleasure” o Heal Mura botou em disco suas experiências psicodélicas, suas incursões pela Ásia e seu processo pessoal com um curandeiro brasilero. Em resumo, uma viagem absurda para ele. E, agora com o disco lançado, para nós também.

Em “Vida Loka, Pt.2”. Mano Brown pergunta: “Que cê quer? Viver pouco como um rei ou muito como um zé?”. Em “Só Eu Sei”, BK devolve: “Viver muito como um rei, essa é minha resposta”. “Diamantes, Lágrimas, Rostos Para Esquecer”, novo álbum do rapper, carrega os dois lados dessa escolha. É o primeiro álbum de Abebe Bikila Costa Santos após conquistas gigantes – a turnê anterior terminou com um show imenso na Apoteose. Chegar tão longe tem seus benefícios, é raro um artista conseguir a liberação de tantos samples nacionais: Evinha, Trio Mocotó, Luciana Mello, Fat Family, Milton Nascimento e Djavan autorizaram o uso de suas músicas e alguns até aparecem como feat. onde foram sampleados. O lado negativo do trono é a solidão, é se tornar alvo de inveja, é ver companheiros de luta se voltarem contra você. “Ninguém sabe quando o inverno chega/ O topo é areia movediça, que eu nunca me esqueça”. E isso é só uma das camadas desse disco., que ainda vamos dessecar mais e mais. 

Músicas que marcam o fim de um relacionamento costumam ser furiosas, a doçura é reservada para o encantamento. Mas o mineiro Tátio, artista gestado no Carnaval de BH, inverte a lógica em “Longe de Mim”, faixa presente em seu novo álbum, “Contrabandeado”. Acompanhado do violão, de cordas e da voz de Zeca Baleiro, a letra com toda calma do mundo deseja que a outra parte fique livre para um novo amor. Um “fique longe de mim” todo carinhoso. Produção do craque Chico Neves.    

11 – Jéssica Linhares – “Samba do Sonhador” (6) 
12 – Julia Mestre – “Sou Fera” (7) 
13 – Rei Lacoste – “Sem Paz” (8) 
14 – Cícero – “Tempo de Pipa” (9)
15 – Menores Atos – “Pronto pra Sumir” (10)
16 – Panteras Venenosas – “Ai Que Saudade” (11) 
17 – Igor de Carvalho – “Pra Te Esquecer” (12) 
18 – Terraplana – “Charlie” (13)
19 – BaianaSystem – “A Laje” (14)
20 – Maré Tardia – “Já Sei Bem” (15)
21 – Dadá Joãozinho – “100 anos” (16)
22 – Bem Gil – “Sobe a Maré” (com Domênico Lancellotti) (17)
23 – Thiago França e Rodrigo Brandão – “Young Lion” com Sthe Araújo e Edgar (18)
24 – Tasha & Tracie, Emcee Lê – “Randandan” com Delli Beatz (19)
25 – B.art – “Nêgo/Correnteza” (20)
26 – João Gomes e Gilberto Gil – “Palco” (21)
27 – Vitor Milagres – “Um Barato” (22)
28 – Bruno Berle – “Te Amar Eterno” (23)
29 – Negro Leo – “Me Ensina a Te Castigar” (24)
30 – Tássia Reis – “Sol Maior” (25)
31 – Maria Beraldo – “Colinho” (26)
32 – Thalin, VCR Slim e Cravinhos… – “Todo Tempo do Mundo” (27) 
33 – Supervão – “Androids” (28)
34 – Liniker – “Me Ajude a Salvar os Domingos” (29) 
35 – Paira – “O Fio” (30)
36 – Dora Morelenbaum – “Venha Comigo” (31) 
37 – Amaro Freitas – “Viva Naná” (32) 
38 – Hoovaranas – “Fuga” (33) 
39 –  Luiza Brina – “Oração 18 (Pra Viver Junto)” (34) 
40 – Exclusive Os Cabides – “AAAAAAAAA” (35) 
41 – Sofia Freire – “Autofagia” (36)
42 – Curumin – “Só para no Paraibuna” com Nellê (37)
43 – Jean Tassy e Don L – “Dias Melhores” (com Iuri Rio Branco) (38)
44 – Crizin da Z.O. – “Acelerado” (39)
45 – Papisa – “Melhor Assim” (40)
46 – Caxtrinho – “Cria de Bel” (41)
47 – Cajupitanga e Arthus Fochi – “Flamengo” (42)
48 – Tuyo – “Devagar” (43)
49 – Rodrigo Campos – “Amar à Distância” (44)
50 – Varanda – “Vida Pacata” (45)


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* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, o cantor e multiinstrumentista alagoano Nyron Higor.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro Vinícius Felix.