Rap, funk, montagem e uma voz que ilumina o Brasil desde a invenção da bossa nova. Essas são as palavras que podem resumir uma semana bonita em contrastes na música brasileira. Perde só quem tapa os ouvidos para a novidade.
“Acima da média, abaixo do radar”, repete como uma mantra Febem na abertura do seu álbum “Abaixo do Radar”, que ainda conta com uma citação bonita a “Jorge da Capadócia”, de Jorge Ben Jor, ecoando a abertura de “Sobrevivendo no Inferno” dos Racionais MC’s. São muitos símbolos e recados deixados pelo rapper. Do beat que começa enganosamente leve, conduzido só por chimbau e piano, até a capa que mostra São Paulo entre a mata e a poluição do ar. Repara no flow: assinatura própria. Uma das músicas diz “Obrigado, Mainstream”, mostrando que ele é lá e cá, o importante é cuidar da família. Moda, grana e sucesso – tudo passa, se não cuidar legal. O segredo é passar ileso, nada consta, pode liberar. Febem sabe das coisas.
O mineiro DJ Anderson do Paraíso já tinha causado neste ano com o álbum “Queridão”. Com seu funk mineiro, este funk mais ambiente e minimalista, que tem em Anderson um dos seus pais, o disco levou um poderoso 7.8 na sempre pentelha “Pitchfork”. Agora ele volta com o EP “Paraíso Sombrio” e chega em uma sonoridade ainda mais… sombria. Dá para chamar de gótica, até. É o funk dialogando com música sacra e fazendo muito sentido.
Em 2022, “O Que Meus Calos Dizem de Mim” deu o devido respeito e reconhecimento a Alaíde Costa, com seu repertório especialmente composto para sua voz. O segundo capítulo da parceria da cantora com os produtores Emicida, Pupillo e Marcus Preto é “E O Tempo Agora Quer Voar”, que mantém a estética chique do trabalho anterior e reúne composições de autores de diversas gerações, muitos em parceria com Alaíde, caso do encontro dela com Emicida e Caetano Veloso na abertura do álbum. Ainda tem escritos de Rashid, Nando Reis, Junio Barreto, Zé Manoel, Ronaldo Bastos, Marisa Monte e Carlinhos Brown.
É difícil encaixar o Pluma em uma categoria ou estilo musical. O quarteto formado por Marina Reis, Diego Vargas, Guilherme Cunha e Lucas Teixeira consegue transitar tão bem em diversos gêneros que em uma música só, caso de “Se Você Quiser”, eles precisam só de 4 minutos para soarem modernos, retrôs, experimentais, pop e mais algumas coisas. Deve ser pelo fato de ser formado por quatro produtores ou até pela calma de surgir e deixar o primeiro álbum maturar legal em um tempo de estrada. O flash estourado que ilumina a capa de “Não Leve a Mal” simboliza que promete ser brilhante o caminho da turma.
Voltando aos palcos de olho em revistar sua história e em nova formação, que conta com dois membros originais, Hélio Flanders e Reginaldo Lincoln, o Vanguart também reveste seu repertório em novas gravações. “Demorou Para Ser”, um dos maiores sucessos da banda, ganha o acréscimo de Fernanda Takai em regravação pujante, dando um novo gás e sabor para a música.
Mulú sofreu com sua criação mais famosa. Seu MTG baseado em “CHIHIRO”, da Billie Eilish, bombou, mas não pode ir para as plataformas de streaming – atualmente só circula pelo Youtube ou por meios alternativos, digamos. Ele até foi roubado por artistas estrangeiros que conseguiram ganhar em cima da criação do brasileiro plagiando seu beat. Como alternativa, agora o beat circula oficialmente em uma versão que tem a voz de Duda Beat, parceiraça de Mulú em várias outras músicas, fazendo às vezes de Billie. Funciona e ficou mais legal ainda, mais nosso. Arrepia, Mulú.
Parece que estamos diante de um superacontecimento na música brasileira. Já está sabendo do Hoovarnas? Trio de Ponta Grossa, a turminha formada por Rehael Martins, Jorge Bahls e Eric Santana produz um mix instrumental de math rock com doses de jazz fusion e psicodelia brasileira. Apenas com baixo, bateria e guitarra, eles te enchem de ideias e sensações enquanto suas músicas vão para muitos lugares. A guitarra acelera uma melodia, enquanto o baixo parece estar em outro lugar e a bateria, uau, nunca é óbvia. Intempestivo, mas certeiro. Contradição que faz a mágica acontecer. É tão mágica a parada que eles gravaram uma música do Boogarins que o próprio Boogarins nunca gravou. Sacou?
E segue o processo de divulgação de “27”, o novo disco do Raça. O single da vez é uma parceria com Carlos Dias, vocalista do Polara. “Debochado” foi escrita por Popoto Martins e Carlos em conjunto, uma missão especial, já que Popoto define Carlos como “uma das maiores referências que tenho no mundo da arte”. Se a parceria é um momento feliz, a letra faz questão de ir para o outro lado ao retratar alguém lotado de problemas a ponto de não saber muito que fazer. “Resolvo todos/ Na minha cabeça”, confessa um dos versos. O tom melancólico é agraciado pelo humor do refrão, obviamente, debochado: “Eu tô zuado/ Desencontrado e debochado/ Não sei por que tá tudo errado”.
Desde o início de sua carreira solo, Liniker parece interessada em descobrir qual é o som que pode chamar de seu. “Indigo Borboleta Anil”, o álbum de 2021, carregava ainda um tanto de seu começo muito voltado à soul music, mas querendo desgarrar para abraçar samba, mpb e o pop. “Tudo”, parceria sua com Fejuca e Gustavo Ruiz e com a co-produção do sempre mágico Nave, parece ter achado algo especial. É pop, brasileira, feita para o rádio, sem matar a essência do que trouxe Liniker até aqui: vozeirão e honestidade cortante na letra. O legal é que agora rola fazer uma baitaaa coreografia bem de diva pop. Ou como anotou Liniker: “Dançá-la é um tesão!”
Coisas estranhas. Coisas estranhas são o nome dessa banda e sua descrição no Spotify: “Gostamos de passear ao ar livre e fazer canções para as pessoas serem mais felizes”. Basta. Já ganharam o nosso coração, gostamos de coisas estranhas. Sem medo de ser feliz ao ar livre. Amanhã sai o álbum dessa banda catarinense, o segundo deles. A impressão é que o disco vai ter mais canções frequentadoras deste Top top.
11 – Bruxa Cósmica – “BOTE” (5)
12 – Adorável Clichê – “Devagar” (6)
13 – Duda Brack – “De Conchinha com a Diaba” (7)
14 – Momo. – “Jão” (8)
15 – Lucia Vulcano – “O Que Me Faz Viver” (9)
16 – PECI – “Doce do Azedo” (10)
17 – Chico Bernardes – “Até Que Enfim” (11)
18 – TRAGO – “Porvir” (12)
19 – FBC – “Não Deixa Secar” (13)
20 – Samuel Rosa – “Não Tenha Dó” (14)
21 – Mundo Video – “SOZINHOS: O Desafio (com Gab Ferreira)” (15)
22 – Rafael Mike – “Viver de Amores” com Elza Soares (18)
23 – Tontom – “Tontom Perigosa” (19)
24 – Vivian Kuczynski – “Me Escapo a Cuba” (20)
25 – Quartabê – “Eu Cheguei Lá” (21)
26 – Jup do Bairro – “Mulher do Fim do Mundo” (22)
27 – Paira – “Música Lenta”(23)
28 – Papisa – “Vai Passar” (24)
29 – Holger – “Escada” (25)
30 – Carlos do Complexo – “Sextos Sentidos” com Menor do Engenho e Marlon do Engenho (26)
31 – Antônio Neves – “Dinamite” (29)
32 – Hermeto Pascoal – “Passeando pelo Jardim” (30)
33 – Silva – “Abram Alas” (32)
34 – Bebé – “Recado Dado (com Dinho Almeida)” (33)
35 – Max B.O – “Impossível Não Achar Possível” (34)
36 – Mateus Fazeno Rock – “Madrugada” (36)
37 – Julia Branco – “Baby Blue” (37)
38 – O Grilo – “Manual Prático do Tédio” (38)
39 – Duda Beat – “q prazer” (39)
40 – Varanda – “Vá e Não Volte” (40)
41 – Taxidermia – “Clarão Azul” (41)
42 – Mirela Hazin – “Delírio” (42)
43 – Bruno Berle – “Te Amar Eterno” (43)
44 – Pabllo Vittar – “Pra Te Esquecer” (44)
45 – Tuyo – “Devagar” (45)
46 – Irmãs de Pau – “Megatron” (46)
47 – Haroldo Bontempo – “Risada (com João Donato)” (47)
48 – Jota Ghetto – “Michael B. Jordan na Fila do CAT” (48)
49 – Deize Tigrona – “25 de Abril (com Boogarins)” (49)
50 – Amaro Freitas – “Y’Y” (50)
* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, o rapper paulistano Febem, em imagem de capa de seu mais recente álbum, “Abaixo do Radar”.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.