A lista desta semana é dedicada a Ivan Conti, o Mamão. Baterista genial, figuraça. Colocamos uma de suas centenas e centenas de baterias incríveis na lista, uma que a gente acha que talvez você nunca tenha escutado. Até porque, certamente, mesmo que nunca tenha ouvido falar no Mamão, você já ouviu a bateria dele – o cara gravou com todo mundo e altos clássicos! Fica a nossa saudade do gênio. Uma pausa de mil compassos.
“TRANSES” é o segundo álbum da ÀIYÉ, projeto solo da não-mais-só-baterista Larissa Conforto. É um disco de encruzilhada, como ela afirma. Mas a encruzilhada aqui não é de dúvida, é de conexão – Larissa faz caber em um disco estilos e gêneros que muitos acreditam que não podem andar juntos. Mas aqui Clara Nunes pode dar as mãos para Rosalía em uma belo passeio. “Amar é mudança” e “que os venenos sejam mel”, indicam “OXUMARÉ”, um date consigo mesma, como afirma Larissa. Combina com o álbum que canta sobre abrir os olhos e os sentidos para tudo o que o mundo permite. Menos restrição, corda, área VIP. A estrada não é de mão única, muito menos uma só.
A nossa poploader Lina Andreosi já deu nosso parecer sobre o novo álbum solo da Julia Mestre, que você talvez conheça da banda Bala Desejo. Mas a gente também quer dar um pitaco: gostamos do álbum, gostamos da referência, do texto e da voz da Julia. Tudo acertado. Fica de destaque o momento mais curioso do disco, com Julia sozinha em seu quarto, com voz, violão e o celular para o registro. “do do u” é uma canção simples, uma curtição intimista, daquelas letras mais interessadas no sons das palavras do que nos sentidos. Julia conta que foi muito inspirada por Billie Eilish a gravar os vocais em casa, um ambiente menos frio que o do estúdio. Não seria ruim mais para frente um EP ou um disquinho explorando essa sonoridade rústica.
O grupo Aláfia é formado por uma turma: Eduardo Brechó (voz e direção), Jairo Pereira (voz), Estela Paixão (voz), Eloiza Paixão (voz) Damião (guitarra e voz), Vinicius Chagas (Sax), Alysson Bruno (percussão), Pedro Bandera (percussão), Gabriel Catanzaro (baixo), Filipe Gomes (bateria), Fábio Leandro (teclado). Desde 2011 na estrada, a banda chega a seu quinto disco em “Além do Lá”. No som do Aláfia, que sempre fez uma belo mix de hip hop, jazz, afrobeat e música de terreiro, entram os estudos de Brechó a partir da pandemia – das vivências até sua pesquisa de literatura de Ifá. “Ifá sempre influenciou o Aláfia por influenciar o próprio candomblé, mas agora podemos dizer que eu fiz uma opção de trazer os temas e narrativas diretamente da literatura de Ifá, passada pelo meu oluwo Baba Wande Abimbola”, diz o compositor. Pesquisar e contar ao mundo é uma das missões do Aláfia, como diz Babá Ifatide Ifamoroti em um interlúdio do disco: “A ancestralidade é nossa via de identidade histórica, sem ela não sabemos o que somos e nunca saberemos o que queremos ser”. Poderoso.
Ninguém chega aos pés d’Os Tincoãs, inventores de um som enorme e catalisador do passado, presente e futuro da música popular brasileira em sua harmonia vocal única. A discografia do trio é curta, proporcionalmente inversa a sua influência. Um álbum nos anos 60, três nos 70 e um nos 80. Mas essa coleção vai aumentar. Gravado em 1983, “Canto Coral Afrobrasileiro” é um trabalho idealizado pelo radialista e produtor musical Adelzon Alves em parceria com Dadinho, Mateus e Badu, a formação do trio na época. São dez faixas onde a trinca se encontra com o coral dos Correios e Telégrafos. O projeto ficou engavetado quando os integrantes se mudaram para Angola. Cerca de 40 anos depois, Mateus Aleluia coloca para jogo essas gravações históricas. Ansiedade pelo material é forte.
E a semana foi dolorida para a música brasileira. Perdemos Ivan Conti, o Mamão, um dos maiores bateristas da nossa história. Gravou com quase todo mundo que você possa imaginar: Roberto, Raul, Gal, Ben Jor… Caiu no gosto dos mais jovens com a eterna redescoberta de sua esperta banda instrumental Azymuth, que celebra seus 50 anos agora em 2023. Do seu extenso repertório de gravações, puxamos uma querida do nosso gosto pessoal, a quase desconhecida e perdida “Minha Mãe Não Sabe de Mim”, 1976, composição da dupla Burnier e Cartier. Mamão faz valer a fama nessa gravação ao se desdobrar em mil na bateria. Parecia uma sinfonia. Mas era um cara e seu par de baquetas.
Tinhorão, dos grandes críticos de música do Brasil, sacou que “Desafinado”, o clássico de Tom Jobim e Newton Mendonça, pegava emprestado por demais um pouco de “Violão Amigo”, samba escrito pela dupla Bide e Marçal nos anos 40. Ou seja, aquela bossa nova era nada mais que um samba recauchutado. Em 1998, João Gilberto, que sempre afirmou ser um cantor de samba, abre um espetáculo dedicado aos 40 anos da bossa nova com “Violão Amigo”, escancarando no arranjo que Tom e Newton encontraram ali sua inspiração desafinada. Pode ser coincidência, mas é como se João, que não era muito de falar, desse seu pitaco sobre quem inventou o que, reverenciando Bide e Marçal sem brigar com Tom e Newton. Falar desse show de 1998 que aconteceu no Sesc Vila Mariana só é possível em 2023 por conta de um resgate do próprio Sesc. O álbum, com essa apresentação de duas horas na íntegra e que sai no final do mês, mas já tem esse sambinha “Rei sem Coroa” a nossa disposição nas plataformas, é a primeira etapa de um projeto chamado “Relicário”, que promete editar mais gravações ao vivo de espetáculos realizados em unidades do Sesc a partir dos anos 1970. A fita de João Gilberto chegou a ser dada como perdida, mas foi recuperada e trabalhada com carinho. Pela qualidade absurda da gravação, já entra na fila dos grandes álbuns de João em sua longa discografia ao vivo (que conta com poucas edições oficiais com áudio impecável e dezenas de piratas com qualidade duvidosa). Quando o disco sair, a gente volta ao assunto com “Violão Amigo”. Por enquanto, viva João, nosso rei sem coroa!!!
“Orí Okàn”, novo álbum de Iara Rennó, é o irmão do álbum “Oriki”, que foi lançado ano passado. Em questão de assunto, dá continuidade a uma dedicada investigação pessoal de Iara sobre sua religião, o candomblé. Do yorubá, Orí Okàn pode ser entendido tanto como a junção da palavra cabeça com coração, que tanto conflitam, quanto como “destino do coração”. Não por acaso que a faixa que abre o álbum, em sutil construção de violão, piano Rhodes e viz, é canção que Serena Assumpção escreveu para Iemanjá, rainha das cabeças, em seu último álbum.
Tem gente que nem sonha, mas o capixaba Juliano Gauche tem acordado dentro dos próprios sonhos. E fez um disco nessa praia. “Tenho Acordado Dentro dos Sonhos” é seu quinto álbum e soa mesmo como tentativa de dar forma ao imaterial onírico, seja através de músicas bem lo-fi, seja nas letras fragmentadas, misteriosas. Como um bom sonho, não?
Minas e suas bandas dos anos 80/90. Se o Skank se despediu dos palcos, o Pato Fu foi menos radical na hora de celebrar seus 30 aninhos. Sentou e fez um disco de inéditas que leva o nome “30” e traz uma porção de inéditas fortes. Quem segurou a onda do confinamento durante a pandemia com certeza vai se emocionar com “Fique Onde Eu Possa Te Ver” e seus versos: “Só peço que aguente/ Que não fique Doente/ Eu Quero Tanto Te Encontrar/ Lá Na Sorveteria/ Quando Tudo melhorar”. Nos papos de divulgação do álbum, a banda formada por Fernanda Takai, John Ulhoa, Ricardo Koctus, Richard Neves e Xande Tamietti conta que celebra a longevidade e tem planos para o futuro. É isso, turma. Não podemos perder mais bandas queridas, não.
Aqui no Top 50 da CENA já celebramos muito YMA e Jadsa, duas artistas novas e gigantesca com álbuns de estreia potentes; “Par de Olhos” (2019) e “Olho de Vidro” (2021), respectivamente. Imagina a nossa felicidade em saber que elas resolveram se juntar, fazer uma duplinha e vão soltar um EP desse encontro especial. “Meredith Monk”, que celebra a compositora norte-americana, é o primeiro vestígio de Zelena, o disquinho colaborativo. Uma sonzeira para quem gosta de inverter as horas. E detalhe: a faixa tem duas das guitarras mais criativas do Brasil conversando; a guita da Jadsa, lógico, e a guita de um certo mestre chamado Fernando Catatau. Conhecem ele de algum lugar?
11 – Emicida e Chico Buarque – “Senzala e Favela” (6)
12 – Rei Lacoste – “Pareando” (com Dunna) (8)
13 – Gio – “Dois Lados” (com Russo Passapusso e Melly) (9)
14 – Ludmilla – “5 contra 1” (10)
15 – Sant – “SSA” (com Luedji Luna e VANDAL) (11)
16 – Bike – “Filha do Vento” (Estreia) (12)
17 – Mundo Video – “Amanhã à Noite Quando Eu Acordar” (com Bruno Berle) (13)
18 – Selvagens à Procura de Lei – “O Verão Passou, Mas o Sol Continua Aqui” (14)
19 – Gab Ferreira – “Forbidden Fruit” (15)
20 – Jambu – “Caso Sério” (16)
21 – Alice Caymmi – “Desfruta” (17)
22 – Getúlio Abelha – “Voguebike” (18)
23 – Terraplana – “Me Encontrar” (19)
24 – Mahmundi – “Sem Necessidade” (21)
25 – Cícero – “Longe” (22)
26 – Kamau – “Classe” (23)
27 – César Lacerda – “Nítido Cristal Puro” (24)
28 – Carolina Maria de Jesus – “O Pobre e o Rico” (com Nega Duda) (26)
29 – Jards Macalé – “Coração Bifurcado” (27)
30 – Rodrigo Campos – “Atraco” (com Mari Tavares) (28)
31 – Rubel – “Lua de Garrafa” (com Milton Nascimento) (29)
32 – Assucena – “Nu” (30)
33 – Sessa – Vento a Favor” (31)
34 – Marina Sena – “Tudo pra Amar Você” (33)
35 – MC Tha – “Coisas Bonitas” (com Mahal Pita) (34)
36 – Bin Laden e Gorillaz – “Controllah” (35)
37 – Pabllo Vittar – AMEIANOITE (com Glória Groove) (36)
38 – Mateus Fazeno Rock – “Melô da Aparecida” (37)
39 – Tagua Tagua – “Pra Trás” (38)
40 – Nina Maia & Chica Barreto – “Gosto Meio Doce” (39)
41 – Chico César – “Ligue o Foda-se” (40)
42 – Danilo Cutrim – “Vai Cair” (42)
43 – Maria Beraldo – “Truco” (43)
44 – Jonathan Ferr – “Preterida” (44)
45 – Mu540 – “Jatada Nostálgica Automotiva” (45)
46 – Jup do Bairro – JUP ME” (46)
47 – Betina – “O Coração Batendo no Corpo Todo” (com Luiza Lian) (47)
48 – Karen Jonz e CSS – “Coocoocrazy (com CSS) (48)
49 – Sara Não Tem Nome – “Agora” (50)
50 – Anelis Assumpção – “Rasta” (49)
* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, Larissa Conforto, a ÀIYÉ, sob foto de Hannah Carvalho .
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.