Top 10 Gringo – Vamos orar: Nick Cave no topo do top. Primal Scream em águas profundas em segundo. E a grande Kim Deal fazendo uns barulhos fechando o pódio

Só tem velho de guerra no nosso pódio desta semana. Nick Cave falando de religião e conversão, o Primal Scream contra o neoliberalismo sombrio e Kim Deal carregando nos graves em seu primeiro disco solo – a primeira vez que ela aparece na capa de um disco. Na conexão Brasil-mundo, também falamos de um norte-americano que ama o Brasil e de uns uruguaios que contarão com ajudinha brasileira. 

Após dois discos densos sobre o luto, Nick Cave e seus parças do Bad Seeds entregam em “Wild God” um álbum de capa branca que parece encerrar uma trilogia sobre o assunto. Mas o branco aqui não representa paz de espírito ou qualquer tipo de superação. Mas também não é um relato de fracasso nesta busca. Ao aproximar sua música de vez de uma canção religiosa, Cave parece se interessar pelo processo de conversão, pelo qual afirma estar passando, e enxergar o quanto de humano há na busca pelo divino. Ele se interessa por esse mistério. Em entrevista para a NPR, Cave declarou: “A estranheza e o mistério são essenciais. E é isso que me atrai particularmente no cristianismo. É estranho”. Uma das músicas se chama “Conversion” e essa ambivalência se traduz nela, com o peso dos Bad Seeds conflitando harmonicamente com corais gospels. Ou então liricamente, quando Nick Cave apresenta na música “Wild God” um deus mundano, olhando com humor para suas falhas terríveis. Essa é a abordagem de um cara que assume fazer música religiosa se valendo da dupla função dessa afirmação: irritar quem acha ele muito profano para a religião e usar de fato seu poder de transcendência. O mais curioso é notar que isso sempre esteve em sua música. 

A primeira dica de “Come Ahead”, próximo trabalho dos ingleses do Primal Scream (sai daqui dois meses), veio em julho com a dançante “Love Insurrection”. Meses depois, mais uma pista, mas em outra direção. Agora veio a densa “Deep Dark Water”, com sua letra sobre nossos tempos sombrios, inspirada na obra do filósofo italiano Franco ‘Bifo’ Berardi, um dos maiores críticos contemporâneos do neoliberalismo e seus efeitos destruidores para diversos campos da vida, da política até o psicológico. Bobby Gillespie, que considera Berardi um de seus heróis pessoais, completa: “É um alerta da história. Aqueles que não aprendem com ela estão condenados a repeti-la”. 

Prepare seu fone para o intenso grave de “Crystal Breath”, novo single do que será o primeiro álbum solo de Kim Deal, “Nobody Loves You More”, a ser lançado em novembro. A faixa dá um banho criativo em tudo o que o Pixies fez sem ela, talvez contando um pouco do qual era o tamanho da baixista na banda – Kim é a produtora do álbum e tem como engenheiro de som para ele o já saudoso Steve Albini, em um de seus últimos trabalhos. Assumir um protagonismo que sempre foi seu talvez esteja simbolizado até na capa do disco: é a primeira vez que ela posa para uma. E, se você é um jovem leitor deste site, saiba que a Olivia Rodrigo acha a Kim Deal a pessoa mais legal da face da terra. E é mesmo.

Ano passado, comentamos por aqui que a pós-punk Thus Love poderia ser fácil sua nova banda predileta. Estávamos empolgados com “Memorial”, álbum de estreia do trio. Agora em forma de quarteto, eles continuam a nos deixar muito sorridentes. “On the Floor” é mais um single de “All Pleasure”, álbum novo programado para o começo de novembro. Falando sobre o quanto é fácil se deixar levar por formas de opressão, “On the Floor”, de acordo com a própria banda, é como uma ponte entre a sonoridade dos dois discos. Se ainda não caiu de amores pelo Thus Love, comece por aqui.  

Gente, que saudade do War on Drugs. Tão muito sumidinhos… Mas apareceram agora na trilha da série “Bad Monkey”, da Apple TV+, que é toda feita de versões de músicas do Tom Petty. Ajuda legal a aplacar a saudade, fora que a conexão dos caras com a obra de Petty é bem forte – poderiam fazer mais e mais destas, hein?  

Provavelmente você conhece o músico americano Adrien Younge de seu projeto “Jazz Is Dead”, selo que se reparte em muitas frentes, mas é mais identificado pelos seus discos ao lado de mestres do gênero: incluindo muitos brasileiros, como João Donato, Marcos Valle e Azymuth. Essa paixão explícita pelo Brasil está exposta em “Esperando por Você”, que fará parte de um disco chamado “Linear Labs: São Paulo”. Repare nos vocais e encontre: Céu, Antonio Pinto, Luiza Lian e Manu Julian. Coisa fina.

Dá para imaginar como é o som dos uruguaios do Familia só de ver o nome desta faixa, que lembra um arquivo de computador tantas vezes editado até sua forma final. Ok, computer. Projeto do compositor Matías Rodriguez, velho de guerra da cena vizinha, o Familia lembra mesmo um tiquinho o Radiohead – ousando nos timbres, ritmos e nas camadas, mas em território seguro nas melodias simples e cativantes. Descobrimos eles porque contarão com a Larissa Conforto, a nossa ÀIYÉ, em sua formação ao vivo. 

O Sleater-Kinney, atualmente uma dupla formada por Carrie Brownstein e Corin Tucker, acrescentou três músicas ao bom “Little Rope” para a edição de luxo do disco. “Here Today”, que ganhou projeções de sua letra por Los Angeles no vídeo da música, é um dos sons incluídos nesta nova versão. É um típico lado B, passa meio sem deixar marcas, mas não é de se jogar fora. Longe disso. 

Que mundo moderno é esse que a melhor banda do momento fica escondida no pôster do Lollapalooza brasileiro, gente? Dito isso, fica aqui nossa alegria de finalmente saber que veremos os nossos irlandeses favoritos em terras brasileiras. Vamos aumentar essa base de fãs por aqui, finalmente! Porque achamos que vai ser histórico.

Já correu para o IMAX mais próximo para ver a versão remasterizada de “Stop Making Sense”, o renovado velho filmaço ao vivo do Talking Heads, dirigido pelo fera Jonathan Demme? A gente foi ver e impressiona a qualidade do som e a imersão que a tela enorme dá ao longa de 1984. Os caras realmente estavam à frente do seu tempo. Dá para contar para os netos que você viu o Talking Heads ao vivo. 

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Na vinheta do Top 10, o grande Nick Cave.
** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.