O pódio é nosso e a poética também. Se Polly Jean Harvey pode com uma palavra só dizer três coisas ou mais, nós também queremos que ela seja três vezes premiada em uma semana. Até porque não é todo dia que tem músicas novas da PJ Harvey para gente premiar, né? Desde que o Top 10 existe é a primeira vez que estamos vendo ao vivo um álbum de inéditas da artista britânica. Vamos aproveitar essa rara chance.
Ela conseguiu de novo. Polly Jean Harvey fez mais um discaço. “I Inside the Old Year Dying” é daqueles trabalhos poderosos, fortes a ponto de a música te atingir anos antes de qualquer mensagem que possam estar nas letras. Harmonias, melodia, voz, instrumentação, tudo te atinge e toca pela emoção transparente. Como a própria PJ tenta explicar, é um trabalho aberto a interpretações, ainda que ela acredite que a mensagem é de amor – amor em sua complexidade, diga-se, que comporta a felicidade, mas também perda e dor. Em entrevista para a NPR americana, PJ explicou, por exemplo, um pouco da poética em “Lwonesome Tonight”, faixa em que, com uma palavra, consegue falar de Cristo, Elvis e reis. Pegou a complexidade? Um álbum para infinitas viagens. É por isso que o pódio é todo dela.
Olha quem resolveu aparecer: Mike Skinner, o homem por trás do grandioso The Streets, um dos papas do garage e do grime. Ok, sejamos justos. Ele lançou em 2020 a mixtape “None of Us Are Getting Out of This Life Alive”, que tem até parceria com o Tame Impala. Mas sejamos ainda mais justos: desde 2011, nadinha de um álbum “completo”, digamos. Mas vem aí “The Darker the Shadow, the Brighter the Light”, que chega lá por outubro e deve vir acompanhado por um filme (!!!) todo produzido por Mike, da atuação até a edição. “Troubled Waters”, primeiro single, mostra que o tempo não fez mal algum a Mike. Som incrível.
Para fazer companhia a PJ, é justo encaixar aqui o violão e o vozeirão da Julie Byrne naquela que talvez seja uma das músicas mais bonitas de 2023. “The Great Wings” é a faixa-título do dolorido “The Great Wings”, álbum que Julie começou a construir com o produtor Eric Littmann, que morreu “de repente” antes que o álbum estivesse completo. Essa perda gigantesca dá o tom do álbum, uma conversa sobre luto na mesma complexidade sugerida por PJ – há espaço para saudade, afeto, toque e calor.
Líder do nosso pódio semana passada, Anohni na retomada de sua banda The Jonhsons entregou tudo e um pouco mais do que desejávamos no impressionante “My Back Was a Bridge for You to Cross”, um título que dá o tom da conversa – amor, dor e perda andam mais juntos do que ousamos imaginar. “Can’t”, por exemplo, é o pedido de um retorno impossível – o amado está morto. Novamente, a temática sombria da letra contrasta com as cores leves do instrumental, que sugerem uma temática muito mais amena. Beleza pura, sério.
Quem dá um play nos britânicos do Yard Act, donos do elogiadíssimo “The Overload”, lançado no ano passado, encontra um pós-punk cheio de balanço, humor torto e vocal quase falado do jeitinho que aprendemos amar. Bem tradicional, digamos. Para sua segunda jornada, a banda indica querer abrir novas portas, experimentando um tiquinho com música eletrônica – é o que eles nos contam com essa música de 8 minutos, que ainda não anuncia um novo disco mas já mostra que eles andam pensando bem no futuro da banda. A segunda parte da canção é muito doida, diga-se. Delícia.
Lembra o começo de 2020? Antes de aquele ano afundar, a inglesa Georgia abriu o ano com o empolgante “Seeking Thrills”, discaço que apontava para um ano gigante para ela (e para todos nós…). Deu tudo errado. Três anos depois, estamos aqui ansiosos esperando pelo novo álbum da Georgia, que leva o nome de “Euphoric” e tem esse single bacana chamado “All Night”, que segundo ela é uma “celebração da vida e do mundo”. Celebremos, como já cantou Kool & the Gang.
Uma das bandas mais espertinhas do mundo hoje, sem dúvidas, é o The Beths, quarteto da Nova Zelândia comandado pela gênia Elizabeth Stokes. Ano passado, o grupo lançou o excelente (e muito elogiado por aqui) “Expert in a Dying Field”, que agora vai ganhar uma edição de luxo recheada por outtakes, demos e a versão acústica de “I Told You That I Was Afraid”, que originalmente é comandada por guitarras abafadas e uma bateria agitadíssima. No violãozinho, ela muda completamente de cara. Outra música.
A gente nunca falou muuuuito sobre o grupo californiano Cherry Glazer por aqui. Mas o projeto da vocalista Clementine Creevy é bem interessante e já tem uma estradinha: está por aí há mais de dez anos. É um rock bem garageiro, na cara. Sem lançar disco desde 2019, a parada da pandemia deu para Clementine um tempo inédito para pensar na vida, já que estava em atividade com a banda praticamente desde os tempos de escola. Essa imersão em si dá a tônica das novas canções, aquelas que falam mais ao coração. O título da música fala em delicadeza, mas Clementine pesa a mão na guitarra.
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* Na vinheta do Top 50, a espetacular PJ Harvey.
** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.