Top 10 Gringo – Ethel Cain e Bad Bunny já fazem 2025 valer a pena. E ainda já temos Horsegirl, Lambrini Girls e o Franz

Uau. O ano dos gringos começou com tudo – os lançamentos não param e só melhoram. Já é papo de termos álbuns para guardar algumas coisas para a lista de melhores do ano lá em dezembro. Para começar, o álbum mais falado do momento, o novo do Bad Bunny. Depois, o estranhíssimo e belo trampo da Ethel Cain. E ainda tem o punk da Lambrini Girls, o retrô do Franz e outras coisinhas mais. Em termos de som, tá gostosinho o ano, hein? 

Na mesma semana em que Mark Zuckerberg mudou as regras do Meta para agradar Donald Trump e os EUA viviam uma tragédia ambiental em seu quintal, com os incêndios em Los Angeles, a americana Ethel Cain lançou o estranhíssimo “Perverts”, álbum que marca sua virada de um gótico quase folk (uma Taylor Swift do mundo invertido) para algo bem mais (mas bem mesmo) experimental, uma espécie de drone e música ambiente bem (mas bem mesmo) sombria. O clima do disco combina com o clima do mundo. A faixa de abertura, que leva o nome do trabalho, abre com 11 minutos de ambiência e pouco texto – começa com um hino de igreja e cai num spoken word sobre masturbação e pecado. Parece a abertura de um filme de terror de Jordan Peele. “Está acontecendo com todo mundo” é o verso final e o mote de “Perverts”. É isso. Ao abordar os pervertidos de um mundo onde a verdadeira perversão é premiada com bilhões de dólares, Cain traduz também o mal-estar de geral com os rumos do planeta. E, se uma das missões dessa viagem era afastar seu som dos fãs ocasionais, que não captavam a sutileza de sua obra e transformavam qualquer coisa sua em meme, talvez isso não dê certo. Por mais estranho que o disco soe, a atmosfera é perfeita para todo tipo de fã obcecado em encontrar os segredos escondidos ali. Está cedo pra falar em disco do ano? Perdoe a pressa. Ah, antes é bom saber a quem Ethel agradeceu quando o disco saiu, saca só:  “Eu também gostaria de agradecer à música drone natural que existe em todos os lugares deste mundo, em caixas de transformadores e linhas de energia na beira da rodovia, na estática do rádio de uma frequência AM vazia, no meu computador quando o projeto do Ableton sobrecarregam a CPU e o barulho distante da interestadual. Eu te amo, som. Você sempre esteve lá para mim”.

Outro que parece ter captado o espírito do tempo é Bad Bunny. Repare no sucesso de “DeBÍ TiRAR MáS FOToS”, seu recém-lançado sexto álbum. Como um disco sobre apagamento cultural, ou mais especificamente sobre como os EUA detonou culturalmente Porto Rico, terra natal de Benito Antonio Martinez Ocasio, ao colonizar o território, se tornou tão popular? A explicação imediata é que Bad Bunny na busca por suas raízes, em uma volta aos ritmos locais e às recordações familiares, soube conectar a conversa política ao coração, termos que vivem afastados pelos interesses dos poderosos e pela dor das vítimas. Fala, canta, sonoriza a saudade através das perdas comuns a todos, representada nas cadeiras vazias de plástico na capa do álbum. Você deveria ter tirado mais fotos dos seus momentos felizes, da sua família, dos amigos e dos amores. Assim, apelando ao básico de todos nós, Benito abriu um diálogo direto com o ouvinte e tornou um assunto difícil totalmente palatável. E tão universal quanto qualquer saudade, afinal o Brasil, toda América Latina e outros cantos do mundo têm histórias parecidas. Também viram sua cultura ficar “norte-americana” demais. Aqui vale repetir a velha frase: “Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia”. Ao falar mais de Porto Rico, Bad Bunny meteu esse golaço no mundo. Ele nunca foi tão popular no Brasil, por exemplo, e já começa a ser. Ao mesmo tempo, começam a circular memes de porto-riquenhos se recusando a falar inglês depois de ouvirem o álbum. Uma revolução que começa com um disco pop e corre por memes seria a cara de um 2025 feliz.

Em 2022, o trio Horsegirl, formado por Nora Cheng, Penelope Lowenstein e Gigi Reece, lançou um dos discos mais legais daquele ano, “Versions of Modern Performance”, estreia que apresentava um pós-punk de primeira linha com fortes toques do melhor do indie (feminino) dos anos 1990. Esse ar continua presente nos singles que antecipam o futuro “Phonetics on and on”, previsto para o mês que vem. Todas as músicas lançadas já aqui como singles são bem boas: “Julie”, “2468” e a mais recente, esta “Switch Over”. Se algo mudou no som delas até o momento, é talvez um cuidado maior com a produção, menos lo-fi e cada vez mais cheia de detalhezinhos.

Por falar em mal-estar da civilização, a capa de “Who Let the Dogs Out”, disco de estreia das Lambrini Girls, lançado sexta passada, traz a duplinha bem entediada durante uma festa. É a dica – assim como as sirenes de polícia que abrem o álbum. E elas não se mostram só entediadas com a situação: elas estão com ódio purinho. Por isso, o punk barulhento delas ataca sem medo homofóbicos, nepobabys ricaços e machos escrotos em geral, seja o chefe abusador ou algum imbecil que senta no ônibus com as pernas abertas. Não é de se estranhar que o disco incomodou uma turma e recebeu algumas notas baixas em plataformas de avaliação. Afinal, elas também se posicionam sempre a favor da comunidade trans e também são pró-Palestina, o que rende represálias dos incomodados. Bom, late que elas tão passando.  

Quando uma banda fica muito conectada com o som de uma época a tarefa de se renovar e seguir costuma ser sufocante – que digam os Strokes. Talvez essa seja uma das explicações para o Franz Ferdinand ter ido se apagando com o tempo, especialmente após o terceiro álbum. O tempo levou Nick McCarthy, parceiro de composição de Alex Kapranos, a voz da banda, e também o primeiro baterista. Da nossa parte, temos responsabilidade nessa treta – fomos dando menos tempo para o Franz, até “reclamando” que eles vinham muito para o Brasil e coisas do tipo. Mas o tempo passa e tudo vai se encaixando. É como diz os versos que abrem “Everdaydreamer”: “Estou bem, só preciso de um tempo para deixar minha mente relaxar”. A banda se encontrou em uma nova formação, em especial com a chegada da baterista Audrey Tait, dando todo um novo fôlego, e agora tem seu primeiro álbum dessa retomada. “The Human Fear” se conecta diretamente com o primeiro trio de álbuns do Franz. Música que vai direto ao ponto, sempre guiada por um riff chiclete de guitarra ou baixo e ambicionando pelo refrão mais viciante possível – sem deixar de ir atrás de outros caminhos, como o pop sofisticado em “Audacious” (totalmente beatle em seu refrão e no seu fim abrupto) ou a noite na baladeira “Hooked”.

Sara Devoe, artista de Nova York, alega também que faz dreampop, mas com pitadas de grunge. Será? Ela tem um gostinho por timbres podres na guitarra, só que seu forte para o grunge parece estar mais nos títulos das músicas, coisa do tipo: “a pior pessoa do mundo”, “por que eu sou assim?” e “chorando depois do sexo”. A voz dela também lembra um pouquinho a Lily Allen. Que combinação, hein? Bom demais.

O Adwaith é um trio de rock galês feminino formado por Hollie Singer, Gwenllian Anthony e Heledd Owen que optou por escrever tudo em galês mesmo, língua mais antiga que o inglês. A escolha curiosa é defendida com unhas e dentes por elas, lógico. Em entrevista ao jornal britânico “The Guardian”, contaram que quando cobram delas letras em inglês, com o argumento de que isso as fariam mais famosas ainda, elas ficam com mais certeza ainda de que o caminho é manter o galês. Tanto que o próximo álbum do trio será duplo (e todo em galês, lógico). “Solas” chega em fevereiro.

Para quem gosta de música muito pirada, recomendamos Jane Remover. A produtora norte-americana promete para 2025 seu terceiro álbum, “Revengeseekerz”. Pelo single “JRJRJR”, lançado no dia 1° de janeiro, dá para criar algumas expectativas: uma maluquice sonora de cortes rápidos e vocais distorcidos – o tal digicore. Gostamos disso, em tese.

Uma música muito legal de 2024 que só descobrimos agora é “Fantasy”, um balanço de Jade, artista britânica que fez parte do grupo pop Little Mix. O single entrega uma disco music atualizada aos moldes da Dua Lipa. Estranho não ter tocado mais… Que em 2025, isso seja corrigido!

Ainda no pop britânico, vale uma olhada na produção da jovem Rose Gray. Em 2025, ela soltará seu primeiro álbum, chamado “Louder”. Dos sons do disco lançados até aqui o destaque é a deliciosa “Party People”, uma faixa perfeita para uma versão mais leve de um “brat” imaginário – um dos parceiro de Rose aqui é o Sega Bodega, produtor queridinho de nomes como Rihanna, para citar uma. Não por acaso, um texto da revista “Vogue” pergunta se não seria Rose Gray a próxima grande superstar britânica. Veremos. Quem gostou do sotaque da Charli XCX, vai amar o da Rose.

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* Na vinheta do Top 10, a incrível cantora americana Ethel Cain.
** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.