System of a Down encara o Rio hoje. Vimos o show de Curitiba e trazemos o que foi bom, o que foi ótimo e o que foi… esquisito

Na noite de terça-feira, estivemos no primeiro das cinco apresentações que o System of a Down está fazendo pelo Brasil. O grupo se apresentou no Estádio Couto Pereira, em Curitiba (foto abaixo), e todo mundo está mais careca que o baixista Shavo Odadjian de saber que a banda da Califórnia com ascendência armênia entrega um show fantástico. E todos também vão dizer e ouvir isso pelos próximos dias, porque o SOAD se apresenta nesta noite de quinta no Rio de Janeiro e tem mais concertos marcado no país, todos em SP, nos próximos dias 10 (sábado agora), 11 e 14.

Aqui na Popload, por tudo isso, aproveitaremos esta oportunidade para tentar falar sobre coisas que, imaginamos, nem todo mundo vai comentar. Começando do mais óbvio, para o menos.

O bom: Sim, a banda está fantástica, tocando bem demais, apesar de o vocal de Serj Tankian ficar meio baixo na mixagem (como também aconteceu em 2015, última vez que a banda passou por aqui). O setlist foi gigantesco e variado, talvez pesando um pouco demais nas power ballads, mas nada que estragasse o clima. Os telões que sobem e descem pelo palco são maravilhosos, e eles poderiam até abusar um pouco mais desse efeito. E, quando o guitarrista Daron Malakian tentou fazer uma cover de “La Isla Bonita”, da Madonna, mas não lembrou de nenhuma parte da letra além do título, foi espontâneo e mais divertido do que se a cover se desenvolvesse corretamente.

O ótimo: Basicamente, o público. Os fãs do System of a Down são um ingrediente essencial da experiência de vê-los ao vivo, quem sabe até mais importante que a própria banda. O texto inteiro poderia ser sobre isso.

Em 2015, tive a chance de ver Slipknot e System of a Down na mesma semana e constatei que seus respectivos públicos têm comportamentos quase opostos. No show dos mascarados, cansei de ver marmanjo suado sem camisa abrindo caminho violentamente para chegar perto do palco – comportamento sem-noção que se repetiu quando os vi pela segunda vez, em 2022. Já no SOAD, a plateia era igualmente apaixonada pelo som da banda que estava vendo, mas entendia a divisa fundamental que existe entre aproveitar o show energicamente e deixar os outros aproveitarem também. Agora, em 2025, foi a mesma história, só que ainda melhor.

O fã do System of a Down é a pessoa que não perde uma oportunidade de fazer mosh, mas sabe bem onde a roda começa e onde termina. Também é o fã que não quer entrar na roda, mas consegue assistir ao concerto do jeito que quer, sem incomodar e sem ser incomodado. É o cara ou a menina que vê os avisos de “proibido entrar com sinalizadores” e se sente motivado a levar ainda mais sinalizadores, porém gera um total de zero incidentes de queimaduras.

Quem paga para ver o System of a Down topa cantar os hits “B.Y.O.B.” e “Lonely Day”, mas canta e pula muito mais com faixas que nunca tocaram na rádio ou na MTV quando a banda ainda lançava álbuns. A recepção a “Chop Suey!”, single de mais de 1 bilhão de execuções no Spotify, parece fria em comparação à reação para faixas de miolo de disco, como “Bounce”, “War?” ou “Needles”. Aliás, dá para dizer que a noite ficou animada mesmo quando tocaram “Deer Dance”, música sobre intimidar crianças com metralhadoras, e os primeiros sinalizadores da noite foram acendidos.

Fechar com “Toxicity” e “Sugar” é perfeito, mas apenas porque a plateia permite e entra no clima, causando a impressão de que o estádio inteiro está rodando e pulando – mesmo quem está parado, só observando e curtindo, parece fazer parte do coletivo.

O esquisito: Não vimos ninguém comentando isso até agora, então seremos cautelosos. A qualidade do conteúdo exibido nos belíssimos telões foi bem inconstante e ocasionalmente distraía, por um motivo peculiar.

Quando os visuais eram mais simples e minimalistas, como o vídeo de câmera de segurança de “Lonely Day” ou o coração batendo em “Psycho”, complementavam perfeitamente o som.

Mas em diversos casos, a banda usava vídeos e ilustrações que tinham aquela cara de inteligência artificial generativa. Sabe aquele desenho perfeitinho, mas bizarro nos detalhes? Aquela filmagem em que os atores parecem fingir serem humanos? Aquela animação por computação gráfica cheia de efeitos, que te faz pensar, “Nossa, isso foi caro, né?”, mas aí os efeitos se dissolvem numa massa homogênea simplesmente feia? O tipo de coisa totalmente sem alma que só a IA generativa é capaz de excretar?

Pois tinha muito disso tudo nos telões do System of a Down – ou ao menos parecia. Eu quero muito acreditar que estou errado, que cada uma das ilustrações pop art em “Radio/Video” foi feita por um artista, e que cada uma daquelas mulheres sorrindo para a câmera em “Dreaming” estava olhando para uma câmera de verdade. Mas fico em dúvida, porque só vejo duas alternativas: ou gastaram muito dinheiro contratando figurantes e ilustradores para gerar tanto conteúdo, ou economizaram milhares de dólares mandando alguém produzir tudo em algum programa.

Seria uma “estética”? Se for, o gosto seria bem duvidoso. Para uma banda que defende tanto a integridade artística, fazer uso de uma “arte” por inteligência artificial generativa parece que vai contra a essência e o propósito da arte – a expressão de humanos. Para não dizer que não temos prova alguma, três dos quatro integrantes do grupo já divulgaram abertamente vídeos feito por essa tecnologia em suas redes sociais.

A maioria das pessoas nos shows talvez nem perceba isso tudo. Mas passamos tanto tempo aqui elogiando o público do SOAD – quem sabe ele não seja justamente o tipo que apoie arte feita por gente de verdade?

Mas, sim, foi um show muito bom. “Arrebatador”, vão dizer por aí.

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* As duas primeiras fotos do System of a Down em Curitiba são da agência Pridia (@pridiabr).