SEMILOAD – Os truques do incrível Lil Nas X, o controlador da nova música

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* Nesta semana o grande evento musical foi o lançamento da canção nova do rapper, cantor e personalidade de internet Lil Nas X, “Montero (Call Me by Your Name)”.
Mas, pera, essa música já não tinha sido lançada? Por partes. Como assim partes?
A coisa não é tão simples quando o assunto é Lil Nas X e seu modo de lançar músicas e conduzir sua carreira. Você consegue acompanhar?
Para tentar entender qual é desse cara brilhante da nova música, convocamos a esperta Dora Guerra, da newsletter parceira Semibreve, que enxerga tão longe que vai desvendar para nós aqui todos os truques incríveis de Nas. Será que todos?

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Com o impacto gigantesco de “Call Me By Your Name”, que é assunto principal na maior parte dos sites gringos sobre música e nos fóruns religiosos, estive me perguntando por que o Lil Nas X era tudo isso. Eu conseguia SENTIR que ele era tudo isso, mas queria achar os argumentos certos.

Em um momento em que os popstars estão se sentindo mais confortáveis com suas sexualidades – expondo-as, explorando-as, não vivendo somente delas, mas dispondo-as quando querem –, Lil Nas X não é o primeiro rapper cis, preto e homossexual a dar as caras (tem uma galera já trilhando esse caminho: Kevin Abstract, Tyler The Creator e afins). É o primeiro, talvez, com esse nível de impacto e com uma relação tão tranquila entre virilidade e feminilidade.

Mas reduzir Lil Nas X à exposição de sua sexualidade é contraproducente – por mais que seja o papo que ele mesmo trouxe, isso por si só não explica a força dele. Sinceramente? Ele é um caso incrível de marketing e gestão de carreira; do tipo que eu faria um textão no LinkedIn se eu fosse outra pessoa com muito menos bom gosto.

Desde o início da sua explosão midiática – com o sucesso inacreditável de “Old Town Road” –, Nas (o pequeno) usa as redes sociais com maestria: é extremamente acessível, bem-humorado e, principalmente, um livro aberto. Seu produto principal não é a música, mas sua personalidade. Seguindo a linha de diversas outras celebridades, ele nos dá a ilusão muito bem construída de que está no controle de tudo que leva seu nome. E, como qualquer jovem inquieto nas redes sociais, ele não desaparece por completo, mas se mantém sempre relevante de alguma forma.

Esse marketing muitíssimo bem estruturado – que liga Lil Nas X a sua música, vídeos e tweets de forma intrínseca –, culminou em uma estratégia de lançamento como eu nunca vi.

Existem diversas formas de divulgar um futuro lançamento e, nos últimos tempos, a expectativa é cada vez menor. Contando com o fato de que todos nós – exceto a Sarah do BBB – estaremos em casa com a disponibilidade de ouvir o que é lançado, os artistas já não precisam espaçar ou fazer grandes anúncios adiantados para garantir que a gente saiba. É quase sempre assim: “Opa! A música nova sai amanhã, o disco sai semana que vem”. E o elemento-surpresa já é tão pouco surpreendente que, na verdade, o inesperado é esperar.

No caso de “Call Me by Your Name”, o truque foi este: deixar a gente esperando, por muito tempo – feito a Rihanna e o Frank Ocean fazem, com o contraponto de nunca realmente entregar. É normal, mas não é: para um artista pequeno, não existe muito propósito em dar pequenas prévias de uma música e não entregá-la por completo; para um artista do porte do Lil Nas X, isso até acontece, mas raramente com essa divulgação deliberadamente caseira.

Em outras palavras: há quase um ano (!!!), a música “Call Me By Your Name” era “vazada” pelo próprio artista, de tal forma que já havia uma compilação de trechos formando a música completa no Youtube. Seu TikTok era composto por vários vídeos com conotações completamente diferentes: memes com Hannah Montana (uma alusão a sua idade, inclusive), zoações com outros artistas ou simplesmente Lil Nas brincando com peitos falsos. O único fator em comum era, invariavelmente, a presença dessa música (até então, não-lançada) como trilha sonora.

Eram dicas, que já sugeriam possíveis (diversos!) usos da faixa no TikTok e em outras redes sociais; mais do que isso, que fizeram fãs implorarem pela música completa e não nos deixaram esquecer que essa música um dia sairia. Principalmente, dicas que ressaltavam o estilo do artista de conduzir tudo “com suas próprias regras”, brincando com a ideia de que sua gravadora inclusive não estaria a par da situação. Sabemos que é pouco provável – tudo deve ter sido arquitetado em conjunto com a gravadora –, mas isso não importa: com seu carisma, Lil Nas X tira tudo de letra.

Já era uma estratégia admirável, mas o resultado final ainda foi impressionante. Sabendo que tínhamos a música quase inteira, ele nos entrega (finalmente) a surpresa completa, contrabalanceando a divulgação caseira com um vídeo absurdo, repleto de referências, polêmico e até político – e se sabíamos muito da música, sabíamos pouquíssimo do vídeo até este sair. Assim, com um trabalho visual de botar qualquer cristão fervoroso para tremer, a falta de ineditismo da música passou batida.

Por fim, ele se blinda de qualquer possível crítica: se levando a sério quando menos esperamos, não se levando a sério quando não precisa. Por um lado, recebemos um vislumbre de um “Montero” mais vulnerável – em print de nota de celular –, desabafando brevemente sobre sua relação com a sua sexualidade; por outro, seu canal segue tendências do YouTube sem parecer forçado, enquanto o artista zoa Justin Bieber e enfrenta (com humor) um processinho da Nike no Twitter. Continuando o que começou, Lil Nas X está sempre online, rindo de si mesmo enquanto se divulga sem dó.

Sempre aparentemente espontâneo e, sem parecer, sempre no controle – com tudo tão bem arquitetado e funcionando, Lil Nas X está longe de ser um caso de one-hit wonder.

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