SEMILOAD – A quem interessa a vida íntima de Taylor Swift? Ao mundo todo, segundo ela

E aí? Já conseguiu um ingressinho mágico para os shows da Taylor Swift no Brasil em novembro? Está na fila louca do Allianz? Se precisa de alguma coisa para matar o tempo enquanto sua vez não chega, eis aqui uma nova edição da SEMILOAD, a “versão Popload” da linda newsletter Semibreve, da Dora Guerra, produzida exatamente para pensar nesse lado romântico-midiático da dona Taylor que é contado por TODOS os seus álbuns. Como, bem definiu Dora, numa “espécie de piada eterna entre Taylor e todos os seus fãs do mundo”. Porque só tem duas coisas certas nesta vida para os namorados de Taylor: a morte e o fato de virar tema de música dela. Certo, Dorinha?

Eu não sei se Taylor Swift é a culpada principal de tudo que acontece com ela… Mas também não sei se ela é a vítima principal.

Tudo começou cedo, o que piora as coisas. Ainda jovem, Taylor deu uma cartada de mestre (que se tornaria, também, a sina que carregaria para o resto da carreira): entender que sua vida pessoal poderia se tornar uma commodity, tendo como produto central os seus relacionamentos.

O seu famoso término com o também famoso Joe Jonas, do Jonas Brothers, lá em 2008, aos 14/15 anos, teria descrição detalhada em talk-shows, em músicas e indiretas por toda a mídia – como se fosse possível ter uma piada interna entre Taylor Swift e o mundo inteiro.

Joe terminou com Taylor em uma ligação telefônica de precisos 27 segundos. Isso é uma informação pública, cristalina, disponível a você via Google ou via qualquer fã da artista.

Era tão perfeito para uma adolescente que, à época, era difícil compreender o quão surreal é essa estratégia. Para mim (e milhões de outras jovens), Taylor estava fazendo o que sempre sonhamos: expondo a dor colossal que é se relacionar com garotos adolescentes, se vingando e saindo por cima. Sim, você adivinhou: eu adorava Taylor Swift nessa época.

Mas não era só isso. Taylor estava lucrando continuamente com a exposição do que há de mais íntimo em um relacionamento, ainda que fosse dolorido ou injusto. É uma extensão da lógica natural da música e da arte: criar em torno da dor uma narrativa. Nesse caso, uma narrativa profundamente autocentrada, amplamente divulgada… E vendável.

Esse mecanismo se tornou a máxima suprema da carreira da artista. Como uma fórmula infalível, todos os relacionamentos (não somente amorosos, vide as infames rixas com Katy Perry ou Kim/Kanye) de Taylor precediam trabalhos musicais, que estariam, claro, repletos de referências e indiretas. Em seu próprio repertório, Taylor criou um universo de easter eggs tão gigantesco e autorreferencial em que os fãs (muitos agora adultos) também seguiram adolescentemente atrás das pistas, de novo e de novo, viciados em uma caça interminável.

Mas o que discerne o método Taylor Swift dos easter eggs dos jogos é a realidade. 

É maluco pensar que praticamente todas as suas músicas têm um nome e sobrenome atrelados, uma história fixa, uma percepção única. Taylor optou, por sua vida toda, por misturar o que é relacionamento, o que é um produto, o que é uma narrativa. Eventualmente, todo namorado de Taylor Swift tem um fim certeiro, além da morte: se tornar tema de música dela.

E, se por um momento ela pareceu sair dessa lógica, agora em 2023 nos vemos nela novamente: um término amplamente divulgado (de um namoro notavelmente discreto), seguido de um relacionamento com Matty Healy, vocalista da banda inglesa The 1975 (outro que ama um marketing…).

Esse, sim, voltou a seguir o padrão reconhecível de acontecimentos. Fotos de paparazzi, dicas em turnê, polêmicas. Desta vez, mais um fator entra em cena: o fato de que Matty, basicamente, não é flor que se cheire.

De repente, a fórmula-Taylor-Swift funciona mais uma vez no sentido de mantê-la nas manchetes, mas eu acho que talvez tenha ido longe demais.

Devido às falas racistas e problemáticas do namorado, fãs da Taylor chegaram a criar petições para o término do namoro, devolveram ingressos para os shows e estão “revoltados” com a artista – corroborando com a noção de que Taylor é quem se relaciona e que essa escolha não é só dela, como de todo o mundo.

Não estou aqui para dizer que ninguém tá certo. Não cabe a um fã opinar na vida pessoal de um artista, ainda que esta tenha sido a prerrogativa principal de toda a carreira dela. Mas não acho que se trate de uma profunda questão feminista – como umas matérias fizeram parecer –, ainda que haja, sim, um fator intrinsecamente ligado ao fato de Taylor não só ser mulher como ser a “boa moça”. 

O que eu penso é que talvez essa situação tenha escancarado o quão insustentável é essa cultura de celebridade com a mídia e seus fãs.

Parece que essa relação específica foi inventada por Taylor, praticamente, mas talvez sirva para prová-la impraticável também. Não deveríamos estar tendo que analisar a pessoa (a)política Taylor Swift pelo prisma de seus relacionamentos; mas ela não está se escondendo dessa exposição, muito pelo contrário. Ela a reforça. Sua carreira tem relação simbiótica com o que é dito pela imprensa, com a imagem que Taylor repercute de si. 

O que me frustra em Taylor não é o que ela foi até aqui, mas o que ela quer continuar sendo. Em uma Síndrome de Estocolmo com a fama invasiva, a cantora segue alinhando sua carreira ao que é discutido sobre ela nas redes sociais – benéfico ou não, ela não sabe mais evitar. 

O mais doido é que pouca coisa é dita. O que Taylor de fato fala raramente é político ou polarizador. Ela se mantém eternamente na segurança das entrelinhas e da interpretação de cada um – seja, inclusive, ao anunciar uma música com a artista que sofreu ofensas racistas do seu namorado. Percebe como ela não deixa o âmbito pessoal escapar do profissional, mesmo quando poderia (ou deveria)?

Acho Taylor Swift um caso exemplar de marketing: infalível, potente, destruidor. Mas a vida de Taylor, sua carreira e seu marketing estão indissociavelmente ligados.

Ela precisa ser, eternamente, o próprio CNPJ?

((obs.: enquanto eu escrevia isto, a mídia anunciava o término do relacionamento em questão, o com Matty Healy; Mais uma vez, esse namoro foi público, mas subliminar, em toda a sua duração – mesmo em seu suposto fim. ))

***
Dora Guerra mantém seus relacionamentos longe de seus tweets, no @goraduerra.