SEMILOAD – A Geração Z e o “do it yourself home edition”. Em minúsculas, cantando baixinho

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* Chegou a vez do nosso “big talks”, nosso “long read”.

A primeira SEMILOAD do ano, a parceria semanal da Popload com a genial “Semibreve”, newsletter escrita pela mineira Dora Guerra, vem falar de Geração Z e de como sua natural autenticidade está quebrando padrões na música. “Sua”, no caso, da Geração Z. “Sua”, no caso também, de Dora, que é da Geração Z.

Vamos?

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Se você existiu na internet nos últimos dias, deve ter visto um enorme bafafá por conta de uma menina que não fez nem 18 anos ainda – uma tal de Olivia Rodrigo. O nome só não é uma surpresa para quem adora “High School Musical”, a série (o que eu imagino que não seja o caso de muitos de nós na Popload). De resto, estamos todos um pouco perdidos.

O pior é que, em tempos de Billie Eilish, uma menina menor de idade explodindo (no que parece repentino) com músicas escritas em mínusculas já não é tão novidade assim. Mas pode ser difícil de acompanhar, compreender, absorver tudo que rola na geração Z.

Para você, que quer entender essa juventude mas não sabe nem por onde começar, aqui vai uma espécie de guia – sobre os jovens tiktokers-multifuncionais-levemente-deprê-com-sexualidade-fluida que estão fazendo ótimas músicas… em terríveis contextos.

É que nada diz mais de um tempo do que os jovens; os jovens artistas, principalmente. E sem querer generalizar uma geração inteira (mas já generalizando um pouco), a tal gen Z é, por definição, majoritariamente consciente e política – muito mais que muitos de nós aos 15, 16 anos. Basta observar o que o fandom do grupo coreano BTS fez no último ano (https://www.theguardian.com/music/2020/jun/24/how-us-k-pop-fans-became-a-political-force-to-be-reckoned-with-blm-donald-trump), por exemplo.

E não é novidade para ninguém, também, que essa galera tá vivendo uma era sombria – mas ao contrário de vários movimentos musicais em tempos de crise, a música gen Z não é necessariamente a quebradêra, o punk ou aquela anarquia sonora toda. Na verdade, a sonoridade tende à baixa energia. Por quê?

Claro, talvez o fator caseiro tenha influência nisso: o que começa por ser simplesmente uma questão natural (onde mais um jovem menor de idade e provável classe média vai gravar suas coisas, se não no quarto?) se tornou uma escolha estética. Não a música de garagem que tomou conta dos anos 90 e inicinho dos anos 2000: agora, é a música de quarto. No quarto, a música tem que ser mais quietinha.

O “do it yourself” define completamente o negócio, aliás: mesmo agora, que não faltam recursos à Billie Eilish para gravar em Abbey Road ou no Electric Lady, ela escolhe manter sua produção em sem lar com o irmão – uma forma levemente afrontosa de dizer “Isso eu faço em casa”. E o ambiente reflete também no som, que geralmente traz um ou outro instrumento do tipo que você tem em casa; muita brincadeira eletrônica; e, claro, o inconfundível jeitinho de cantar sussurrado (ou quase).

Mas, com certeza, há um fator emocional – uma certa sensação de apatia, vindo de uma galera que discute (e faz vários memes) sobre saúde mental como nunca antes. Nas letras de muitos artistas e bandas novos, assuntos como depressão, ansiedade e pânico são citados com a mesma naturalidade em que se falava sobre festas há um tempo atrás. Há, claro, uma certa romantização dessa tristeza (como a indústria tem mania de fazer).

Mas essa melancolia não deixa de ser real: hoje, a gente vê tudo que acontece no Brasil com muita raiva, mas se sente incapaz de agir. Imagina só essa carga emocional em alguém que acabou de passar pela adolescência?

Daí talvez venha o cantar baixinho, o escrever em minúsculas – um misto de introspecção muito contemporânea com vontade de fazer algo diferente.

Outro ponto interessante é que se trata de uma geração expert em autoexpressão e que entende – finalmente – que cada um sabe do seu. Daí, temos uma galera que não se preocupa com gênero ou sexualidade ou simplesmente não se prende em nada disso; se veste como quer e, claro, atravessa gêneros musicais com a mesma fluidez. É uma forma de quebrar moldes muito menos agressiva do que se tentou fazer um tempo atrás; é quase natural, não pede licença ou desculpa.

A título de comparação, basta olhar Sam Smith – aos 28 anos e uns 6 desde sua explosão mundial, Sam finalmente se sentiu confortável para assumir sua não-binariedade; com pouco mais que a metade da idade de Sam, uma leva de novos artistas já tem suas identidades bastante definidas, sem que isso seja uma notícia. É um processo delicioso de acompanhar: eles são quem são, fazem suas músicas e ensinam a gente que seus pronomes ou sexualidades não são necessariamente o ponto principal de sua arte.

E é possível porque a indústria não necessariamente dita os sucessos com a mesma facilidade que anos atrás. Na verdade, muitos dos jovens de hoje são os próprios formadores de sucessos. Nesse auge de TikTok e afins, é a própria geração Z que define os próximos hits – respeitadas as devidas proporções, claro. Assim, gigantes feito Beyoncé têm que dividir as paradas com filhotes-de-Soundcloud, que fazem músicas no quintal.

O charme da geração Z é que tudo é muito cru, direto quando precisa ser, exposto sem paredes. Não existe distinção da persona online para a pessoa real, tampouco para o artista – quando você cresce com redes sociais, não sabe nem se dar a esse privilégio.

O resultado é uma música que vem de quem já não tem medo de se expor, sabe explorar a internet como ninguém e é, inevitavelmente, autêntico.

Aí vem a leva de gente talentosa que não dá para ignorar: Claud, BENEE, Arlo Parks, JADEN e por aí vai. Galera que ouviu muito Frank Ocean e Lana del Rey enquanto mexia no Tumblr e agora arregaça as mangas com seu estudiozinho ligado no PC.

Não que sejam só fenômenos naturais: para não ignorar a Olivia Rodrigo, que eu arrastei para o texto só para ter pretexto (rs!), é interessante observá-la para entender onde a indústria entra nisso.

Existe gente já sendo “fabricada” nesse molde; não tô dizendo que Olivia não tenha mérito pelo seu próprio sucesso, mas ela está longe de ser uma adolescente desconhecida lançando uma ou outra coisa no YouTube, gravada em seu quarto.

Muita gente já percebeu que é possível investir no bedroom pop sem que o bedroom seja necessariamente parte da equação – pode ser um estúdio, pode levar a um estádio.

Mas fato é: com sucessos moldados ou não, a geração Z está acontecendo. Tá mudando o jeito que as coisas funcionam, como toda boa geração faz. Com muito mais força, sem se preocupar com o politicamente correto, porque já têm consciência demais para isso. Sendo eles mesmos – e, por acaso, quebrando alguns padrões no meio do caminho.

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* As fotos deste post, a lá de cima e a que ilustra o chamada da home da Popload, é da cantora americana não-binária Claud.

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1 comment

  1. Sou da geração Old School e a minha única pergunta é : se apresentando em grandes festivais, arrregaçam ao vivo? Tudo bem não ter banda, pero ao menos cantam de verdade??
    Passar bem!!!

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