Popload ouviu – “Garatujas”, Tangolo Mangos. Disco de estreia da banda baiana é uma roda gigante de estilos e temas

De tempos em tempos bate aquela sensação de que o futuro do rock está em perigo. Quando a gente olha para os gêneros musicais que estão em alta no Brasil e o fato de que a música sertaneja é a mais ouvida pelos jovens, parece que a juventude não tem interesse em continuar o legado do rock nacional. 

Mas existe esperança e ela cresce com cada vez mais força na CENA, vindo de lugares além do eixo Rio-SP. Como é o exemplo da banda baiana Tangolo Mangos. 

Formado em 2017, o quinteto lança nesta sexta-feira seu primeiro álbum de estúdio, “Garatujas”, e trazemos aqui as primeias impressões sobre o disco. 

Com dois EPs lançados, este “Garatujas” chega para a Tangolo Mangos como uma promessa cumprida depois de muitos desafios que a produção musical independente já impõe, somados aos efeitos da pandemia sobre o trabalho criativo.

É um disco que vem sendo preparado desde a formação da banda. Em um trabalho colaborativo, a produção de “Garatujas” é assinada pelos cinco integrantes: Bruno Fechine (vozes e percussões), Felipe Vaqueiro (vozes e guitarra), João Antônio Dourado (bateria), João Denovaro (vozes e baixo) e Pedro Viana (vozes e guitarra). 

Já na primeira música as referências nordestinas ficam aparentes no riff de guitarra que introduz “Canaã”. Num autointitulado baião rock, o eu-lírico reflete sobre essa dor da juventude que é ter esperança frente às dificuldades da vida adulta.

Um dos diferenciais da banda, que é reforçado ao longo do disco, é o uso de diferentes recursos instrumentais, como a sanfona e rabeca de Joca Lobo e principalmente a percussão para construir sonoridades menos genéricas de rock. 

Seguimos para um rock mais experimental com “Animais Noturnos”. E aqui entra o elemento da diversidade de composições no disco, com colaborações de todos os membros da banda e colegas da CENA. As músicas ganham uma pluralidade de pontos de vista, o que deixa o disco dinâmico. E nesta faixa em particular temos uma ótima participação de Yves Deluc, da banda sergipana Cidade Dormitório, com o estilo de falar cantado tipo desenho animado que os caras chamam de cartoon rock. Doidera.

Na dupla de singles do disco, “Poca” é uma velha conhecida dos frequentadores de shows da banda e também mais psicodélica, enquanto “Hélio” é resultado de um laboratório maluco de diferentes tipos de rock que vão do garage ao kraut, passando pela psicodelia e o metal. Trata-se de umas dessas experimentações de quem tem sede por aprender mais sobre música. 

E talvez seja esse o ponto deste disco. São 13 faixas que encapsulam o processo de cinco jovens em se tornarem músicos ao longo desses últimos cinco anos, de aprendizados e experimentações. 

“Garatujas” (capa acima) tem músicas que vão desde uma experiência com uma dor de cabeça, que poderia ser só mais algo do cotidiano, como é o caso de “Enxaqueca”, até reflexões sobre os algoritmos que permeiam a sociedade digital de hoje, em “Algoritmos (Você Me Conhece Tão Bem)”.

E por que não eternizar uma brincadeira de colégio? Como fizeram em “Glauber Rocha”, em que a banda gravou o “hino” que os meninos e seus amigos entoavam enquanto iam para o Cinema Glauber Rocha depois da aula. 

A faixa que encerra o disco, “Roda Gigante ou Rebimboca da Parafuseta Cósmica” encapsula o conceito do álbum perfeitamente. 

É uma música que teve seu início lá em 2017, quando o co-autor Brian Dumont criou o riff e a harmonia principal, e ao longo de sua construção a faixa foi ganhando uma série de nuances de diferentes gêneros, se tornando a música mais progressiva do disco e explorando folk, samba, baião, hard rock e psicodelia.

Na letra, reflexões sobre “as transformações das relações causadas por distanciamentos geográficos, a expectativa da espera e a incerteza angustiante da retomada (ou não) desses laços”. Para ao final, retomar a melodia de “Canaã”, a abertura do disco, num fechamento de ciclo perfeito. 

“Garatujas” é o primeiro trabalho de uma banda cheia de coisas para falar, vontade de se arriscar e que está experimentando como executar sua visão. Com um frescor necessário para a CENA, a Tangolo Mangos praticamente coroa o ano com este disco, uma última novidade antes de encerrarmos mais um ciclo. 

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* As fotos da Tangolo Mangos usadas para este post são de Ricardo Dantas.