Popload no Lolla 2023 – Internacional. O que vimos e o que achamos

Muitos vieram, alguns não, e teve (não teve) o forfait do Drake e o caso do baterista da Aurora, no trem internacional que nos atropelou de sexta passada ao último domingo. Mas se tem algo de “aprendizado” que tiramos da ala internacional da décima edição do Lolla 2023, fora alguns shows marcantes, foi a consolidação e cada vez maior popularização de artistas via TikTok, fenômeno que estamos assistindo há um tempinho já. mas que nesta edição do gigante festival paulistano ficou batendo ali, na nossa cara.

A impressão que dava em algumas horas de Lolla era a de que parecíamos mais estar na “For You” do app de vídeos curtos do que num festival. Sabe quando você nem conhece a banda, mas aí toca uma música e você fica com a sensação de que já ouviu aquilo antes?

Se antes as rádios faziam esse papel, agora você pode ter ouvido o hit de um headliner no TikTok. E isso fica muito nítido no coro do público durante as canções. Um exemplo perfeito foi “Happier than Ever”, da Billie Eilish, cujo coro final do público nos shows viralizou ao longo da turnê e aqui em São Paulo foi ensurdecedor. 

Mas, enfim, do Lolla em cima do palco, na parte internacional, porque do nacional já falamos, ficou assim o que achamos:

– Suki Waterhouse – Quando você ouve ex-modelo, atriz e agora cantora, a expectativa é de ver mais uma popstar fazendo um som pré-fabricado no palco, acompanhada de suas dançarinas. Bom, esse não é o caso de Suki Waterhouse. A britânica começou a fazer músicas lá em 2016 e de tempos em tempos lançava um singlezinho, até chegar no ótimo álbum, “I Can’t Let Go”, que saiu no ano passado. Suki nos mostrou no Lolla um show delicioso de indie-pop de movimentos ensaiados, vocais fortes e clima bem intimista, acompanhada por uma banda simples – só guitarra, bateria e baixo. Apesar de sua ascensão recente à carreira na música, Suki Waterhouse chamou uma boa quantidade de fãs para vê-la em Interlagos, provavelmente um pouco graças à “Daisy Jones & The Six”, série onde faz uma personagem inspirada em Christine McVie. 

– Mother Mother – A banda candense veio a São Paulo para substituir o ausente Dominic Fike. Foi uma substituição à altura? Talvez não tenha sido, mas no contexto foi bom. Mother Mother viralizou no TikTok durante a pandemia, então o público estava já familiarizado com algumas de suas canções. E, para ajudar, a banda fez alguns covers que mantiveram o calor do momento. A versão toda própria da clássica “Creep”, do Radiohead, foi até interessante.  

– Conan Gray – Este veio tocar para o público novinho, mas fez uma ótima abertura para Lil Nas X. O melhor amigo da teen sensation Olivia Rodrigo tem alguns hits virais como “Heather” e “Maniac”, que mantiveram o show animado até nas músicas mais tristes. Conan é um desses artistas com potencial para ser enorme, destes que você vê subindo visivelmente nos line-ups dos grandes festivais. Acompanhemos.

– Kali Uchis – Sabe a lógica de colocar as músicas mais conhecidas no fim ou até mesmo espalhá-las ao longo do set? Bom, a Kali Uchis subverteu essa “artimanha” e entregou tudo no começo. Apesar de a cantora ter achado que não fez um bom show e até ter cancelado sua performance seguinte, na Colômbia, a apresentação dela no Lollapalooza trouxe todos os seus hits. Imagine, ela abriu com “Telepatía”, e fez aquele refrão delícia de “See You Again” logo de cara. Não faltou a novinha bombator “Moonlight”, claro. Foi perfeito para quem queria ver as famosinhas da Kali Uchis e correr para o Lil Nas X no palco “ao lado”.

Polo & Pan – A dupla francesa de DJs composta por Paul Armand-Delille (Polo) e Alexandre Grynszpan (Pan) transformou o algo longinho Palco Adidas em uma pistinha intimista e gostosa para quem preferiu pular o show da Kali Uchis. A primeira apresentação do duo no Brasil contou com efeitos visuais modernos e coloridos, além de vocais ao vivo da amiga Victoria Lafaurie, que também dançou pelo palco, com coreografias que lembravam aquelas aulas de ginástica da escola. Vibe.

– Lil Nas X – O primeiro grande headliner da primeira grande noite do Lolla chegou com tudo: decoração e altas parafernálias no palco, acompanhado de dançarinos, intervenções, figurino impecável e a primeira de três participações de Pabllo Vittar no Lollapalooza deste ano, que já chegou abrindo um espacate e batendo cabelo. para dar nossas boas-vindas ao músico americano. Lil Nas X entregou hits e simpatia passando por músicas mais recentes como “Montero”, canções mais “antigas” como “Old Town Road” e remixes que misturavam trechos de Kanye West e Michael Jackson. Destaque para os dançarinos no “dance break”, que trouxeram uma batalha de movimentos e muito voguing ao som de Anitta, Rihanna, J Balvin e Beyoncé. Showzão.

– Billie Eilish – 100 mil pessoas. É difícil visualizar como cabem 100 mil pessoas num lugar, muito menos em frente a um palco, mas esse foi o poder do fenômeno Billie Eilish, 21 anos, em sua primeira visita de shows ao Brasil. Billie, sempre acompanhada por seu irmão, Finneas, fez um show emocionante. Billie fez um trabalho ao vivo muito bonito com o irmão e um baterista para traduzir sua fulminante carreira dos últimos anos. Este talvez tenha sido o show mais “diverso” do festival: era clara a empolgação da turma mais nova e da turma não-tão-nova-assim que quis ver o “fenômeno” Billie de perto, assim como a mistura de estilos musicais que se fez presente em sua performance. A parte pop, a introspectiva, a eletrônica, a bossa nova. Esteve tudo lá, bem equilibrado. Por tudo que o cerca, teria sido a grande apresentação do Lolla BR 2023?

– Jane’s Addiction – Tem shows que envelhecem mal. Seja pela insistência de certos clichês na música, visual cafona, plásticas esquisitas ou tudo junto e misturado. Esse é o caso do show do criador do festival, Perry Farrell. Dançarinas seminuas com ar de clube de strip decadente acompanharam a apresentação que muitos acharam lamentável. Talvez os únicos pontos altos tenham sido os efeitos psicodélicos do telão que também acabavam alterando as imagens da tradução de libras e a homenagem póstuma a Taylor Hawkins.

– Wallows – Sabe aquelas bandas meio skatistas dos anos 1990, tipo um Blink-182 antes do “Enema of The State”, mas um pouco mais pop? Essa é a Wallows, também californiana, também de Los Angeles. Eles vêm vindo na onda do hype do vocalista-ator, Dylan Minnette, desde 2017 e conquistaram um público expressivo no Brasil, que fez um significativo volume no show da banda no sábado. Foi uma apresentação, digamos, animada. E os gringos pareciam surpresos com a quantidade de público que se juntou diante deles em Interlagos, claro que tirando um proveito dos fãs que estavam lá para ver o headliner daquela noite, o Twenty One Pilots, uma banda até próxima em sonoridade à Wallows. 

– The 1975 – Menos canastrão que de costume, Matty Healy mostrou sinais maduros em sua firme apresentação com sua banda no Lollapalooza. É incrível sentir, ao vivo, como a banda cresceu, sem exatamente ter saído do lugar com seu som pós-britpop. Talvez tenham chegado ao limite, mas o limite até que é satisfatório. Um show que não muda a vida de ninguém, mas deixa a sensação de que foi uma hora gostosa de ter sido gasta, ali, diante deles. Na real, diante de Healy, dando uma de crooner à la Serge Gainsbourg, fazendo charminho de terno, cigarro e bebida.

– Tame Impala – Uns minutinhos antes de o Tame Impala aparecer para mais uma apresentação no Brasil, desta vez na categoria de “banda gigante de topo de festival”, o público precisou assistir a um vídeo institucional explicando os efeitos do uso do Rushium, medicação imaginária parte do conceito do disco “The Slow Rush”, que avisava o que aconteceria a seguir: uma energia psicodélica absurda que talvez só com a presença ao vivo fosse possível sentir.Kevin Parker, que optou por ir até o fim da sua turnê mesmo poucos dias depois de uma cirurgia no quadril, foi um herói no Lolla 2023. Com ajuda de muletas e uma banda incrível, a última parada da “Slow Rush Tour” (sim, acabou em São Paulo) contou com um set que passou por seus quatro álbuns de estúdio, tocando inclusive, “Alter Ego”, que não era tocada ao vivo há um bom tempo. Existem produções, com luzes e artifícios como chuva de papel (no relation!), que são chamativas para esconder que a música não é lá muito boa. Mas também existem produções que são construídas para entregar a música muito boa ainda da melhor forma possível. Foi o que aconteceu. Parker parecia emocionado. Nós ficamos emocionados. Que show absurdo!!

– Aurora – Imagina como seria um show de fadas e duendes numa floresta encantada escandinava. É mais ou menos assim como descreveria a performance da Aurora, que terminou falada tanto pelo que aconteceu em cima do palco quanto fora dele. A cantora norueguesa e seu público proporcionaram talvez o maior clash de fãs do Lolla 2023, construindo sonoramente um clima angelical antes do pancadão espanhol da atração seguinte, a Rosalía. Aurora arriscou várias frases em português, declarando seu amor e mostrando respeito com os povos indígenas e a natureza. Foi um show doce e delicado, para quem embarca no estilo dela. E antes da tormenta catalã que viria a seguir.

– Rosalía – Menos de um ano depois de se apresentar pela primeira vez no país com a sua famooooooosa “Motomami World Tour”, a cantora arsty catalã voltou a São Paulo mostrando mais uma vez por que ela é um fenômeno. A receita de como viralizar nas redes sociais funciona perfeitamente ao vivo: sim, durante muitos momentos ela fica de costas para o público, mas acompanhada o tempo todo por uma câmera que registra de pertinho suas expressões e realça a apresentação como um todo, o que leva para o público mais distante do palco, e até para quem só viu na TV, uma apresentação intimista. E o que dizer sobre o carisma de Rosalia? Mesmo resfriada e tendo um chumaço de cabelo arrancado pelo ventilador do palco, ela não se abalou, riu, chamou gente da plateia para cantar junto (e apareceu a Gloria Groove!), colocou o espanhol de todos à prova e trouxe no set até o EP em parceria com o namorado, Rauw Alejandro, o cantor de reggaeton porto-riquenho, que foi lançado na sexta anterior. Rosalía, seus dançarinos, a câmera que a persegue e a joga desnuda para o telão mesmo num show “privado” para tipo 80 mil pessoas. Tudo é tão sofisticadamente pop que dá incômodo chamar de pop. É arte. Por nós, teria show da Rosalia todo ano.

– Fred Again.. – Tudo muito louco na vida da sensação da nova eletrônica que já aparece para tocar no Brasil e ainda num festival gigantesco como o Lollapalooza. Fred viu o amiguinho que trouxe na viagem, o Skrillex, de repente virar headliner do festival e ainda foi meio prejudicado pela concorrência com shows bombados tipo Tove Lo e o povo que já estava rumando ao palco da Rosalía para arrumar bom lugar. Apesar das complicações, o Fred Again.. fez um set ótimo no Lolla, ainda que para um público que foi enxugando à medida que o set só melhorava. Mas, pensando em tudo o que envolve o Fred Again.. e seu atual momento, o set do Lolla na real foi só um aquecimento para o after no Zig Studio, baladinha que se mostrou bem mais animada.

– Skrillex – Para quem tava passando desavisado pela porta do Lolla e virou o substituto do nomão (e furão) Drake, o Skrillex até que serviu uma trilha sonora ao mesmo tempo moderna e abrasileirada, graças aos rasgos eletrônicos aplicados em cima de funk daqui ou até em música de Pixinguinha/Marisa Monte. Criou a vibe frita ideal para quem estava se arrumando para ir embora do Lolla, misturou fumaça e luzes e ainda trouxe a Ludmilla para cantar duas músicas e aumentar ainda mais a fervura de final de semana já bastante quente do festival, que encerrou assim um importante ciclo no Brasil.

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* Popload no Lollapalooza Brasil 2023 – Lúcio Ribeiro, Daniela Swidrak, Vinícius Felix e Lina Andreosi. Fotos: Flashbang