Popload entrevista: Jim Reid, do Jesus & Mary Chain

Saiu hoje na Ilustrada da Folha de S. Paulo uma entrevista que este espaço fez com Jim Reid, um dos seres mais geniais e geniosos da música alternativa das últimas décadas. Com o seu Jesus & Mary Chain, Jim volta ao país nos próximos dias e fala sobre como a banda ainda resiste ao tempo, um possível novo álbum, sua conturbada relação com o irmão William e sua (não) relação com a música nova de hoje em dia. O grupo escocês toca em São Paulo no domingo (25), dentro do festival da Cultura Inglesa, no Memorial da América Latina. Na terça, 27, é a vez do Vivo Open Air, na Marina da Glória, no Rio.

A Popload reproduz a matéria que saiu na Ilustrada, abaixo, em versão “bigger, better & uncut”.

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Quase não dá para acreditar que a lendária banda escocesa Jesus & Mary Chain consiga se manter viva a ponto de vir tocar pela terceira vez no brasil, como vai ocorrer no próximo dia 25, um domingo, quando estrelam outra edição do festival da Cultura Inglesa em SP.

O espanto não é pelos 30 anos da banda que incidentalmente causou uma revolução de estilos no rock em 1983/1984, quando botou as guitarras a serviço do barulho puro, da microfonia desenfreada, mas com uma melodiazinha bem lírica e bonita de fundo, quase inaudível.

O fato que surpreende é que os dois irmãos que construíram a história da banda e da música independente britânica, Jim e William Reid, se detestam há muito tempo. A ponto de fazer Noel e Liam Gallagher, a família Oasis, parecerem estar brigando para ver quem preenche o álbum de figurinhas da Copa primeiro.
“Sim, a relação entre a gente não é e nunca foi a ideal. Nunca foi e nunca vai ser. Nós conversamos quando temos necessidade de fazê-lo. Praticamente nos vemos em cima do palco apenas”, declarou Jim Reid, vocalista do Jesus & Mary Chain, em entrevista à Popload por telefone.

Por causa de briga, os Mary Chain acabaram em 1998. Por causa de dinheiro, eles voltaram em 2007.
“A gente voltou porque o Coachella Festival vinha incisivamente nos oferecendo um bom dinheiro. Por três anos tentaram nos convencer a tocar lá, promover nossa volta. O engraçado é que quando eles conversavam comigo eu sempre achava que o Will nunca iria querer voltar com os Mary Chain. E, quando falavam com ele, Will sempre achava que eu não aceitaria jamais. Um dia, falando com meu irmão ao telefone sobre o assunto, resolvemos topar”, revelou Jim.

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A formação clássica da banda, nos anos 80

“Tem sido difícil, mas no final das contas é um trabalho. É o que sabemos fazer. Às vezes é bom, às vezes é ruim. Como grupo musical, a gente discute bastante ainda mais, pontos de vista bem diferentes, mas de alguma forma a banda ainda funciona em apresentações ao vivo. Que é o que importa no momento. Até quando não sei dizer.”

O Jesus & Mary Chain, que toca ainda no Rio de Janeiro, no dia 27, no festival Vivo Open Air, já se apresentou no Brasil duas vezes. Uma em 1990, com shows solo no Rio e SP, e outra somente em SP, no festival Planeta Terra de 2008.
“Tocar no Brasil sempre foi bom. A primeira vez foi um pouco tumultuada, porque nossos shows eram naturalmente tumultuados. A segunda, em um festival, foi arrebatadora. A experiência de shows na América Latina é incrível, porque o público é sempre intenso, participativo e… jovem. É encorajador ver pessoas novas realmente sabendo as músicas do Mary Chain, interessadas na banda. Isso nos mantém vivo mais que o dinheiro”, disse o vocalista.

No ano passado, a banda lançou uma caixa comemorativa com todos os seis álbuns da banda em vinil, do histórico début, “Psychocandy”, ao derradeiro, “Munki”, mais um disco ao vivo de bônus. Qual dos álbuns do Jesus & Mary Chain o vocalista Jim Reid mais se orgulha de ter lançado?

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Os irmãos treta, Will e Jim

“É uma pergunta impossível de responder. É como perguntar para um pai qual seu filho favorito. Eu tendo a proteger mais o Munki [1998, o sexto e último disco do J&MC lançado], o mais difícil dos álbuns que fizemos. William e eu não suportávamos estar no mesmo ambiente. Brigamos com a gravadora e lançamos por outra. As pessoas tentam associar esse ‘tempo ruim’ da banda ao ‘Munki’ como se isso tivesse afetado o resultado do disco, mas acho ele tão bom quanto os outros cinco. Sinto que ele foi subestimado.”

Sobre a possibilidade de um álbum de inéditas ser lançado, Jim Reid diz que ela é real: “A gente vem falando de um disco novo há muito tempo. Nós temos as canções. As músicas não são o problema para esse disco sair, porque elas existem. O negócio é que temos um desentendimento de como lançar, quando, quais músicas entrar, qual caminho seguir. Mas uma hora o disco sai.”

Um dos caras que revolucionou a música nova, ao lançar há três décadas um álbum “inaudível”, fazer shows curtos de no máximo meia hora e cantando de costas para a plateia, não acredita muito mais na música nova.

“Eu perdi o costume de ouvir canções de bandas de hoje, não sei muito o que está acontecendo. Eu parti de Londres para viver mais sossegado, no interior, longe de toda essa movimentação. Não vejo muita coisa que realmente me interesse na ‘new music’ britânica. Quando você tem a minha idade [52] e viveu todos esses anos ouvindo rock, você percebe que o círculo já foi formado, tudo já foi feito e dificilmente sairá algo realmente novo na música”, decretou o mais novo dos Reid (Will hoje tem 55 anos).
“Tudo o que surge hoje na música empresta sonoridades, influências, postura de músicas das bandas velhas. Não estou falando que isso é necessariamente uma coisa ruim. Nós mesmos emprestamos muita coisa de Velvet Underground, Beatles. Muita”

Como Jim Reid enxerga hoje a bagunça causada pelo disco “Psychocandy”, 30 anos atrás?
“Para ser honesto, até hoje parece que o ‘Psychocandy’ faz sentido para as pessoas, porque muita gente vem comentar ainda sobre o disco. Novas bandas botam ele na lista de influências, o que me deixa surpresa, porque hoje muita gente que tem banda nos dias atuais não era nem nascida quando o álbum foi lançado. É óbvio que eu fico orgulhoso. Tem muita lição boa para se tirar disso. Você não precisa ser tecnicamente impecável para lançar um bom disco. Atitude, energia e um punhado de canções boas podem resultar num grande álbum. Num álbum que dure.”

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