POPLOAD ENTREVISTA: BELLE & SEBASTIAN

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* Um dos shows mais legais do planeta hoje, desculpe a falsa modéstia, é o da banda escocesa querida e cultuada Belle & Sebastian, que desde o comecinho dos anos 2001 passa pelo Brasil com sua máquina de fofuras em forma de música. O B&S, que lançou no ano passado o deliciosamente dance “Girls in Peacetime Want to Dance”, tem percorrido o caminho de festivais cool e cidades bacanas com o show desse disco, que contém ainda um telão incrível, galera dançando no palco e energia impressionante para uma banda gigante e que já tem nove discos lançados. Esse caminho de festivais passa pelo Brasil em outubro, quando o grupo de Glasgow estrela o Popload Festival, em São Paulo.

Sobre o admirável jeito Belle & Sebastian de ser, o poploader João Vitor Medeiros conversou com o tecladista Chris Geddes por telefone, entrevista essa que pode ser conferida aqui embaixo.

Na década de 90 talvez seja Belle & Sebastian a banda que mais se aproxime de simbolizar o que poderíamos chamar de espírito de banda independente, posto que os anos 80 é, indiscutivelmente, dos ingleses do The Smiths. Contudo, diferentemente da trupe liderada pelo excêntrico Morrissey – ativa apenas por um período de cinco anos -, os escoceses estão prestes a completar duas décadas tocando juntos, mesmo que ainda sejam, em grande parte do tempo, definidos pelos primeiros trabalhos.

Isso, contudo, não é algo que incomode a banda. Sobre isso, mais o disco mais recente, o show no Brasil e até política, Chris Geddes disse o seguinte:

Sobre o novo disco do Belle & Sebastian, experimentar com música eletrônica não é algo novo pra vocês, mas nesse disco algumas canções foram talhadas especialmente para a pista de dança. Foi uma coisa natural ou foi algo calculado?

 Acho que foi uma coisa bem natural. Nós usamos a música eletrônica antes, eu acho que voltando bastante no tempo. Até no “Tigermilk” já tinham indícios de música eletrônica e no “[The Boy with the] Arab Strap” nós adicionamos muitos sintetizadores e baterias eletrônicas. No último disco nós usamos os mesmos elementos, mas, com o jeito que o disco foi feito, talvez não tenhamos dado tanta ênfase a esse tipo de coisa. Senti que foi muito natural, que foi guiado pela própria composição das músicas, a canção simplesmente sugeria aquele tipo de abordagem. Nós temos seguido esse caminho por nós mesmos. Eu tenho tocado mais sintetizadores do que piano, por exemplo.

Uma das canções do disco, “Enter Sylvia Plath”, é bem diferente de tudo que vocês já fizeram. Pode me falar como foi compor e gravar essa faixa?

 Sim… Foi uma música escrita pelo Stuart [Murdoch]. Em termos do estilo, ele veio até nós com a canção e a primeira coisa que fizemos foi programar as linhas de baixo, então esse talvez tenha sido um jeito diferente de começar. Uma vez que tínhamos isso, só fomos tocando por cima, do jeito que normalmente fazemos. Eu acho que isso veio diretamente do Stuart na concepção mesmo da música, ele queria esse estilo, essa produção, então nós naturalmente fomos nessa direção.

 É na linha eurodance, certo?

 Sim, sim, tem um pouco de Giorgio Moroder, um pouco de ABBA e coisas assim, mas isso não foi feito conscientemente. Começamos a tocar a música, as coisas foram caminhando. Foi como que se eu estivesse no órgão Hammond ou no piano buscando o som certo.

Esse disco traz coisas bastante pessoais sobre o Stuart, como o resto da banda se sentiu sobre isso?

 Acho que tiveram músicas do passado que me atingiram mais do que as que estão nesse disco. Nós fizemos uma música chamada “I’m Waking Up to Us”, em 2001 ou por aí, e se tornou bem óbvio na época que era uma música que o Stuart tinha escrito sobre a Isobel [Campbell, que deixou a banda em 2002], e ela ainda estava na banda na época e foi engraçado estar lá assistindo a isso tudo enquanto ela não estava dizendo nada e nós não sabíamos se era a hora ou lugar para falar algo. Mas nesse último disco, em “Nobody’s Empire” [faixa que abre o álbum], mesmo sabendo que é uma coisa muito pessoal do Stuart e sobre o que ele passou com a Síndrome da Fadiga Crônica, acho que ela foi escrita de um jeito tão não-óbvio que eu não percebi sobre o que ele estava cantando no momento em que gravamos.

 Então você não se sentiu um intruso ali?

Não, eu acho que não. O jeito que a banda geralmente trabalha é: alguém traz uma música, o cantor escreve as letras e adianta como vão ser as mudanças de acordes e tão logo nós começamos a tocar a música, você pode perguntar como a pessoa quer que você toque ou qual o contexto daquilo, mas raramente você pergunta à pessoa sobre o que ela está cantando ali.

Vocês tiveram no ano passado o referendo sobre Independência da Escócia. Isso influenciou de alguma maneira a produção do disco?

Nós já tínhamos terminado o disco na época em que o referendo aconteceu. Claro que a campanha do referendo não foi curta, durou oito meses até a eleição. Eu acho que fez com que as pessoas em geral na Escócia ficassem mais interessadas em política e passassem a se importar mais com esses assuntos, e talvez isso tenha entrado no álbum de uma maneira indireta no nosso trabalho. Mas o referendo era algo que a gente estava conversando entre nós, dentro da banda, e obviamente na comunidade de artistas a gente perguntava o que os outros estavam pensando, então obviamente era um assunto em que a gente pensava bastante.

E o que você achou do resultado?

Fiquei surpreso porque todo mundo com quem eu conversava, no meu bairro ou no Twitter, todo mundo pensou que o voto seria “Sim” (a favor da independência). No bairro em que eu moro parecia que todo edfiício e janela tinha um cartaz de “Sim”, você não via nenhum poster para o “Não”. Ali não conversei\\ com muitas pessoas que expressassem vocalmente sua preferência pelo “Não”.

Você ficou desapontado?

Sim, eu fiquei. Eu fiquei desapontado pelo resultado e por ter feito com que eu percebesse que o grupo de pessoas em que eu vivo não é o reflexo da sociedade como um todo. Isso me choca um pouco.

Às vezes a democracia é dura, certo? (risos)

(risos) Sim, mas tem sido um processo bom. Quero dizer, o número de pessoas que votaram no referendo foi muito maior que o número que vota nas eleições gerais. Então serviu para mostrar que as pessoas não necessariamente vão deixar a política de lado se você der a elas algo em que elas sintam que o voto delas faz diferença, e isso é importante. O movimento pelo “Sim” também teve vitórias e assistir a esse grande movimento político acontecer foi realmente animador.

Ano que vem vocês vão completar 20 anos de banda, mas muitas vezes vocês ainda são definidos pela sua sonoridade dos anos 90. Isso te incomoda?

Não, de maneira nenhuma. Eu acho que nos consideramos tão sortudos por poder viver de música que enquanto tivermos isso… Quero dizer, o que a gente fez nos anos 90 não é algo para o que possamos deliberadamente voltar, porque você simplesmente não consegue, a música que você faz é um produto da pessoa que você é e nós não somos as mesmas pessoas que éramos lá. Significa muito para nós que a música que fizemos ainda se conecta com as pessoas. E ainda tocamos essas músicas ao vivo, essas músicas ainda se conectam com a gente quando estamos no palco. Eu ainda gosto de “Like Dylan In the Movies”, parece fresca para nós. E eu não sinto que fazemos isso só pelo dever de fazê-lo. Então nos sentimos felizes com a nossa produção, ter gente do mundo inteiro escutando a nossa música e se conectando com ela. Nos sentimos muito sortudos com isso.

E, nestes 20 anos em que vocês estão juntos, vocês alguma vez consideraram acabar com a banda?

Eu acho que quase deixei a banda depois dos dois primeiros discos. Eu ainda era um estudante na época e eu sentia que eu estava sofrendo para estar na banda. Não tinha certeza que a banda estava indo numa direção com a qual gostaria de estar comprometido.

Quando foi exatamente isso?

Bem no começo, pelo final de 1997, começo de 1998, nessa época. E houve um momento em que eu era bem próximo da Isobel e do Stuart David [baixista que ficou na banda até 2000]. Me parecia à época que continuar na banda sem um dois seria impensável. Chega a um ponto que você percebe que estar na banda e fazer música é tudo que você quer fazer e, se tem uma pessoa que não quer mais fazer isso, tudo bem, é um direito dela, mas você não precisa acabar a banda por isso. Então não acho que teve um ponto em que todos ao mesmo tempo estivessem pensando: “Talvez nós devessemos parar, acabou”. Para mim sempre teve um grupo de pessoas comprometido em continuar.

E vocês viram de perto essa grande mudança na indústria musical com a internet e todo o processo. Como você vê a relação das bandas com a vida digital?

 É complicado, não é? Eu entendo que, quando você está criando música, está criando uma experiência e, com sorte, está criando uma conexão emocional com as pessoas que estão ouvindo seu trabalho. Nós viemos de um tempo em que o único jeito de obter essa conexão era por meio de um objeto físico, fosse um CD ou um LP. Então eu acho que para nossa geração talvez seja um pouco difícil se adaptar ao fato de que não é sobre o item físico mais. E, quando você tira esse item físico, é mais difícil ganhar dinheiro fazendo música, porque o objeto é o que as pessoas pagam. Ao mesmo tempo, eu acho que todo mundo na banda está dos dois lados disso, todos nós usamos streaming e Youtube para escutar música e o fato de que toda canção está disponível para escutarmos é fantástico, porque nós também somos fãs de música. Eu não sei se você viu isso, mas o Caribou fez uma playlist de 1000 músicas no Youtube, sabe? E eu tenho escutado isso pelos últimos dias… Até mesmo os discos que eu tenho nas minhas prateleiras, é complicado tirá-los de lá e colocar para tocar. Às vezes eu só os coloco no Youtube porque está muito mais à mão.

E, tirando o Caribou, você escuta outros artistas “novos”?

Sim, sim, eu escuto um monte de bandas novas. Tem um disco de uma cantora chamada Jane Weaver que eu achei muito boa. Também uma cantora e compositora chamada Kate LeBon fez discos que eu gosto. Gruff Rhys do Super Furry Animal lançou um disco solo chamado “American Interior” que eu adorei.

Eu gostei desse também.

Sim, sim! Ele chegou a tocar no Brasil ao vivo?

Não, depois desse disco ainda não.

Se ele for, você deve ir vê-lo ao vivo, porque é fantástico. E tem algumas bandas em Glasgow que eu acho que são muito boas também. Tem uma banda chamada Casual Sex meio pós-punk, meio disco, outra de nome Gold Teeth que são muito bons também. Há um componente africano no som deles, um monte de ideias interessantes por ali. Então, sim, eu escuto um monte de coisas novas. Mas também passo muito tempo ouvindo discos antigos de soul e de reggae.

E vocês estão vindo tocar no Brasil em outubro [dentro do Popload Festival]. Você se lembra de alguma história marcante que tenha acontecido das outras vezes que vocês estiveram aqui?

Sim, vividamente! A primeira vez que fomos ao Brasil foi muito surpreendente, tocar para um público que sabia todas nossas músicas e cantavam junto conosco enquanto tocávamos. Obviamente, você sabe, nós gostamos muito de música brasileira, das coisas da Tropicália. E nós fizemos algumas versões enquanto estávamos aí. Estávamos no Jô Soares, o programa de TV, mostrando nossas tentativas de tocar música brasileira. Foi muito bom, mesmo.

Vocês tocaram Mutantes, certo?

Isso e nós tocamos a versão da Gal Costa de “Baby” do Caetano também.

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