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* Galera brasileira curte um festival gringo faz tempo. Desde os anos 90 eu me deparo com “patrícios” em todo lugar do mundo a que fui atrás de uma reunião de bandas boas num mesmo evento. Mas talvez não tenha festival mais prazeiroso e “bem acabado” que o Sasquatch, hoje em dia, desde que você não se importe de ir longe e montar uma logística minimamente decente.
O Sasquatch, pode ser que já você tenha tido a oportunidade de ter lido por aqui, é um evento com umas 130 bandas que acontece por quatro dias no Memorial Day, o feriado americano que inaugura o verão de shows por aqui (não exatamente a estação, veja bem). A data, em lembrança aos mortes das guerras em que o EUA se meteu, é sempre na última segunda-feira de maio. E o Sasquatch, de uns anos para cá, já é armado forte desde a sexta anterior ao Memorial Day.
O festival fica a três horas de carro de Seattle e cinco de Portland, duas das cidades indies mais delícia dos EUA, com tradição de cena, casas de shows, rádios boas, lojas de discos infernais, galera atuante, as bandas todas. As estradas para o festival, tanto de um lado como de outro, são lindas de morrer, tranquilas, cheia de paisagem típica deste canto americano.
Entre o Sasquatch e Seattle, por exemplo, você passa pela cidade de Snoqualmie, um lugarejo no meio de uma floresta de montes com neve no pico mesmo quando está calor e árvores altas. É onde tem a Snoqualmie Falls, queda d’água famosa que aparece na vinheta de abertura do histórico seriado Twin Peaks, que leva ao riacho onde foi encontrado o corpo envolto num plástico da deusa Laura Palmer. Lembra, né? Fiz umas fotinhos da região. Só não comi o famoso donut.
O Sasquatch acontece num anfiteatro natural chamado Gorge, uma ribanceira linda que serve de arquibancada para o gigantesco palco principal, colocado aos pés da colina, com um cenário atrás típico de aquarelas de paisagem de eras renascentistas: o rio, as montanhas, o vale todo, as nuvens, o sol e depois a lua. No alto do vale, para trás do anfiteatro, mais três palcos e uma grande tenda eletrônica são montados.
A não ser que você acampe, é muito difícil ficar perto do Gorge Amphitheatre, o local onde rola o Sasquatch. Já me hospedei em Quincy, a meia hora de carro, e desta vez descolei um hotel em Ellensburg, cidade no meio do nada onde tem uma universidade importante porém pequena do Estado de Washington, uns rodeios às vezes, umas cachoeiras e é isso. Ellensburg está a 50 minutos do Sasquatch, dirigindo. Mas o que poderia ser um saco para ir e principalmente voltar, na hora do cansaço na madrugada, é também uma atração, pelo espetáculo visual de pontes incríveis, lagos e o rio Columbia, o que passa atrás do palco do festival, colinas, plantações de uva e as hélices gigantes dos geradores eólicos, que ornam qualquer estrada dessas, já bonitas.
Diferentemente do Coachella e do Lollapalooza de Chicago, para pegar dois exemplos famosos e cada qual com sua beleza estonteante e praticidade ou perrengues particulares, o Sasquatch é um festival “manejável”. Não porque você consiga beber sem estar num cercadinho e fumar maconha (se for a fim, claro) sem culpas e perseguições (a erva é liberada para uso recreativo no Estado de Washington, o que evoca uma outra discussão no caso do Sasquatch). Mas sim porque nele você lida com 35 mil pessoas, quando está absurdamente lotado, espalhadas em um formato irregular de festival. Não é com 80 mil, 90 mil num retângulo gigante, como no Lolla e no Coachella. Isso implica, obviamente, no ir e vir, nos banheiros, na caça ao que comer e beber.
E fora as bandas escolhidas. Cada um com seu gosto, claro. Mas, tirando o Pitchfork Festival, de Chicago, sempre considero o Sasquatch o festival com melhor curadoria desses médio-grandes dos EUA. Vai ao pop, ao hip hop, ao eletrônico, ao punk, ao velho e ao novo com uma esperteza de seleção que só quem está numa região perto de Seattle e Portland pode fazer.
Sasquatch 2016? Desde que tempo e $$$ permitam, acho que sim.
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