Música ou morte. Crack Cloud, do Canadá, lança o disco de estreia mais importante do ano

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Jennilee Marigomen
Crack Cloud por Jennilee Marigomen

* A história é bem mais complicada e polêmica do que vou falar aqui, mas tem uma rua famosa no centro de Vancouver, Canadá, chamada Hastings. Ela faz parte de uma área de exceção da cidade, chamada de Downtown Eastside, onde as drogas são liberadas desde os anos 90, mais “oficialmente” nos anos 2000. Liberadas numas.

Em vez de combater o uso descontrolado de drogas da cidade com repressão, as autoridades de Vancouver resolveram liberar o uso de heroína, cocaína, metanfetamina entre outras uma antiga parte do centro histórico e cultural da cidade, que havia virado uma região pesada de prostituição, gente sem-teto e comércio de drogas, e consequentemente crimes, para mais bem cuidar da população afetada pelo vício e pobreza.

Longe de ter a “feiúra abandonada” de uma Cracolândia, por exemplo, e até porque a região de Downtown Vancouver ganhou uma profunda remodelação para atender às Olimpíadas de Inverno em 2010, a rua Hastings e arrecadores ganhou um monte de clínicas de recuperação, farmácias, hospitais e a maior delegacia policial do Canadá, para oferecer seringas limpas, assistência social, psicológica, alimentar e outros tipos de ajuda para uma das cidades que mais tinham perdido o controle no número de infectados por HIV e de morte por overdose na América do Norte toda.

Desse ambiente controverso de Vancouver saiu a banda Crack Cloud, que lançou sexta-passada um dos álbuns de estreia mais importantes do ano, “Pain Olympics” (capa abaixo).

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A banda, que na verdade quer ser chamada de “coletivo”, e tem designers e cineastas em seu meio, foi formada há uns dois, três anos por sete ex-viciados fixos e um monte de agregados a caminho da recuperação, que encontraram na música um jeito de lutar contra a complicada situação do vício. O grupo chega a ter 17 integrantes às vezes.

A Crack Cloud, na verdade, nasceu para ser um desses trabalhos sociais que oferecia alguma ocupação para quem quisesse ter uma ocupação/distração enquanto procurava um jeito de sair decentemente de alguma clínica de reabilitação. Mas foi além.

O single “Ouster Stew” é uma das músicas mais tocadas nas rádios independentes inglesas. Se você sintonizar agora a estupenda BBC 6 Music, por exemplo, é capaz de você ouvir a ótima canção, meio post punk, meio gipsy, um pouco de jazz, até de hip hop, é muito indie e tem um solo de bateria no meio dela!

“Pain Olympics” tem ganhado críticas entusiasmadas de várias publicações, que a entende como uma banda não só musical como conceitual, de uma galera que ao mesmo tempo quer fazer música boa e se manter viva. Porque também olha, como postura política, para os que, como eles, não conseguiram/conseguem sair do vício, formar bandas e escapar de uma vez da Hastings.

A Crack Cloud é mesmo uma banda diferente. Não dá para separar a grande música que fazem da história deles. Não há meio-termo nas conversas com Zach Choy, o cantor e aparentemente líder do coletivo. “Acho que desde o começo da banda era muito importante para nós sermos transparentes sobre de onde viemos, do lugar de viciados e de pessoas com histórias destrutivas.”

“Pain Olympics” está em todas as plataformas e no Bandcamp da banda canadense.

A gente escolheu três pérolas musicais deste disco especial de banda especial para que você bote seu foco, de cara, se você ainda não teve a oportunidade de encontrá-los.

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* O Crack Cloud tem sete datas para apresentações ao vivo no Reino Unido e uma na Irlanda para novembro. Vamos ver se vai rolar mesmo.

** A foto do coletivo usada na abertura deste post é de Jennilee Marigomen, para a “The Quietus”.

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