Lolla, dia 2 – o Arcade Fire e “o resto”

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Com bem menos público, o domingo e último dia do Lolla foi perfeito. Trens mais vazios, sem pressão nos “gargalos” entre um palco e outro, menos filas e um line-up ótimo. Pensa: domingo em São Paulo com Johnny Marr (e 1/2 Smiths), Vampire Weekend, Savages, um Pixies no fim da tarde, talvez um Soundgarden ou um Jake Bugg e terminar a noite com New Order e Arcade Fire. Vai demorar para ter outro domingo como este. Entre os shows que a Popload conferiu de perto, dá para destacar que…

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* O virtuoso guitarrista e cada vez mais vocalista Johnny Marr não se incomodou com o p*** sol que tomava conta da região de Interlagos e não perdeu a pose e o visual “sou britânico do norte sim, e daí?”. Durante uma hora, esbanjou competência nas faixas de seu disco solo “The Messenger” e nos clássicos dos Smiths. Junto com o Arcade Fire, Marr ganha uma estrelinha no quesito “ai, que emoção” do Lolla 2014 pelo fato de dividir o palco com seu ex-companheiro de banda, o baixista Andy Rourke. Juntos, mandaram “How Soon Is Now?” e, como alguém espirituoso falou no Twitter, “fez Morrissey arrancar os bobs do cabelo em algum lugar da Inglaterra”. No entanto, o sentimento que fica é o de que Johnny era o cara certo, no lugar certo, escalado na hora errada.

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* A escolha mais difícil do dia foi entre Savages x Vampire Weekend. Pegar uma banda fresquinha, boa e que nunca tinha tocado no Brasil ou ver a outra que você adora, com disco novo lindo, mas que você já viu outras vezes? Sorte de quem tem fôlego e pernas compridas e conseguiu se deslocar pelos dois palcos (com uma cidade de distância entre eles) e pegar metade um e do outro. O clima favoreceu o Vampire Weekend. Sol bombando, perfeito para o batuque do Vampire Weekend. Mas, o verãozão fora de hora também deu um charme à apresentação pós-punk das meninas do Savages, todas vestidas de preto, como era de se esperar. Jenny Beth é o melhor exemplo de vocalista que vale o show. Ela transforma as músicas do (único) disco em um show à parte. Não dá para tirar os olhos dela e das performances a la Ian Curtis. Tudo isso do alto do seu salto 12 COR DE ROSA. A única peça colorida no palco. Prendeu a atenção e deixou o público que desencanou da corrida até o Vampire Weekend bem feliz.

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* Mesmo com algumas músicas novas, o show do Pixies não foi tão diferente daquele de 2010, no SWU. Mas aquele show teve Kim Deal, ausência sentida no show de ontem. We Miss You, Kim!! Paz Lenchatin, que entrou no lugar da oooutra Kim, faz o que pode, mas tem participação quase nula nos vocais e interação zero com o resto da banda. No entanto, é difícil um show do Pixies ser ruim. Foram 22 músicas e com um setlist deste tamanho, foi fácil pra Francis Black incluir os maiores hits e ganhar coro da plateia, mesmo que ele nem tenha dado um alô sequer ao público.

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* Já o Soundgarden estreou no Brasil para um Palco Ônix de plateia lotada. Abriram com a básica Searching With My Good Eye Closed, e logo começaram a desfilar uma mistura de hits e canções favoritas dos fãs que não chegaram a virar singles. Fizeram a ótima escolha de só tocar uma das músicas “novas” após meia hora de show, e teve uma resposta tão boa quanto o resto do setlist. Lentamente, um mosh pit foi se formando do lado direito do palco, e evoluiu até chamar a atenção da banda, quando o baixista Ben Shepherd gesticulou com as mãos para fazer um circle pit, e Chris Cornell elogiou as “pirâmides humanas” que se formaram.
A relação entre banda e plateia foi essencial para o show, que progrediu de forma orgânica e culminou em Beyond The Wheel, com Chris Cornell correndo para cantar no meio da plateia, e voltando com a manga da camiseta rasgada. Ao contrário do Nine Inch Nails, que fechou o mesmo palco no dia anterior, o Soundgarden se entregou aos fãs, e fez o show junto com eles, ao invés de para os mesmos.

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* Nove anos depois de vir ao Brasil pela primeira vez, no papel de coadjuvante dos Strokes no extinto Tim Festival e com apenas um único disco a mostrar daquela vez, a banda canadense Arcade Fire volta no redentor papel de atração principal do encerramento do festival Lollapalooza, com um público todo em elevado grau de entrega, envolvido pelos hits e pelas músicas novas de seu álbum recente, “Reflektor”, seu quarto disco. E por várias referências brasileiras.
O que se insinuou um “carnaval de gringo” no começo, com o telão mostrando cenas carnavalescas do filme “Orfeu Negro” (produção ítalo-brasileira de 1959) momentos antes de a banda subir ao palco, virou mesmo uma ópera indie, com rebuscada sonoridade que vai do pop barroco francês à disco music promovida por 12 músicos no palco durante pouco mais de uma hora e meia de apresentação.
O show foi espetacular da primeira à 17ª canção tocada, da nova “Reflektor” à emocionante “Wake Up”, do álbum de estreia, lá de 2004, com direito a citações cantadas de Tom Jobim e Caetano Veloso no setlist.
O vocalista, pianista e guitarrista Win Butler, regente dessa orquestra que um dia já foi underground mas agora tem um status muito maior, ofereceu a tocante “Suburbs” para São Paulo. Papel picado, um homem de espelho percorrendo a plateia, máscaras de papel machê. O carnaval da galera de Montreal fez muito sentido na terra do Carnaval.
A troca constante de instrumentos da enorme banda e a simbiose perfeita de Butler com sua mulher, Régine Chassagne, seja nos vocais fortes dele ou nas dancinhas dela, dão um equilíbrio empolgante ao show do Arcade Fire, o que faz os detratores chamarem de “Teatro Mágico do Canadá”, mas os simpatizantes o proclamarem uma das melhores bandas ao vivo do mundo hoje.
Pelo visto no Lollapalooza neste domingo em São Paulo, a segunda opção é bem mais apropriada ao “conceito Arcade Fire”.

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* Fotos
Sebastião Moreira / EFE
Adriano Vizoni / Folhapress
Avener Prado / Folhapress

* Equipe Popload no Lolla
* Cobertura: Lúcio Ribeiro, Ana Carolina Monteiro e Fernando Scoczynski
* Central: Alisson Guimarães
* Fotos: I Hate Flash

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