
Quatro anos após o elogiado disco “Ensaio para Destruir” (2021), o compositor mineiro Fernando Motta se reinventa, misturando o shoegaze e dreampop à música de MG, e retorna com o álbum de sugestivo nome “Movimento Algum”, lançado nesta semana.

O disco vem com um recheio interessante para quem prega “movimento algum”. O novo trabalho de Motta conta com participações da inventiva dupla Paira (MG) e da bombada banda terraplana (PR), além de produção de Thiago Klein (Quarto Negro, Apeles).

Fernando Motta já é conhecido e reconhecido na cena nacional, muito pelo seu disco anterior e ainda pela Geração Perdida de Minas Gerais, um movimento local de arte e música entre amigos que virou conceito importante para a cena indie mineira alguns anos atrás.
Mas, agora, o músico se reinventa e vai além, trazendo novos temas e ambientações em seu trabalho.
Sons das ruas e das serras de BH…
A sensação de escutar o álbum é, de muitas formas, sinestésica: os arranjos das canções remetem à paisagem verde-cinzenta das serras de Minas Gerais, especialmente agora quando chega o frio do inverno. Fernando Motta traz ao ouvinte uma mistura entre o shoegaze, o dreampop e a boa música mineira. A capa de “Movimento Algum”, abaixo, transmite essa sensação:

Em especial, nesse aspecto, destaca-se a faixa “Ladrilhar”, que exemplifica bem essa mistura do atual com o clássico. A faixa traz inspirações dos mestres Beto Guedes e Lô Borges, explorando elementos de arranjo, como o piano e o violão gravados ao estilo Clube da Esquina, e elementos líricos, como a letra que remete à cultura popular, fazendo referência ao espaço da rua, e à oralidade das cantigas.

Entre o grito e o sussuro
No novo álbum, as já conhecidas guitarras do rock alternativo agora dividem mais espaço nas músicas com violões e, principalmente, sintetizadores brilhantes, que parecem trazer uma certa magia para a obra. Existe, em “Movimento Algum”, um contraste muito interessante entre os intensos sons assustadores das guitarras e os timbres delicados dos instrumentos de teclas. Em “Espelho”, essa sonoridade atmosférica fica bastante evidente, como se o som se alterna-se entre gritos e sussurros.
Após quatro anos, Fernando Motta retorna com um excelente trabalho que investiga o pertencimento, a espiritualidade e o impacto das pequenas rupturas na vida. A dicotomia entre o efêmero e o eterno permeia todo “Movimento Algum”. O disco reforça a qualidade de ótimo compositor do artista, que através de suas letras e melodias consegue ambientar o ouvinte em alguma Belo Horizonte distópica mas, ao mesmo tempo, muito real.
“Enquanto estamos vivos/ Entra/ Faz o som correr/ Quando a voz sair”
***
* CENA viva é o nome da nova série de textos da Popload que busca jogar luz às excelentes movimentações pontuais da CENA musical independente brasileira, cada uma em sua geografia e com suas características próprias. Outros posts da série:
* BH – Beagrime: a inusitada mistura entre os sons de Londres e BH que agita a capital mineira
* RJ: Vera Fischer Era Clubber ilumina um lado B sombrio da nova cena do Rio. Com sarcasmo carioca, claro. Conheça o single “Fantasmas”
* RS: Heróis indies de Porto Alegre, banda Superguidis arma retorno aos palcos depois de 13 anos. O recomeço é em SP, no sábado
* SC: Indie da Ilha: conheça a cena alternativa de Florianópolis que leva ao resto do Brasil a “música manezinha”
* SP: Você já ouviu falar mesmo de emo caipira?
* BR: Bruno Berle, Dora Morelenbaum e Ana Frango Elétrico: a noite em que a nova safra da MPB se reuniu em BH
***
* Este texto é de Clara Campos.