Temos uma tradição forte de festivais independentes no Brasil, desde os anos 90. Alguns destes eventos sempre flertaram com a nova MPB (ou a nova velha), trazendo artistas nacionais para compor o line-up, como os bravos Bananada (Goiânia), Coquetel Molotov e Abril Pro Rock (Recife), Do Sol (Natal) e o Se Rasgum (Belém), para citar alguns. Mas boa parte do line-up, ou pelo menos os horários nobres dos palcos principais, estavam sempre reservados para bandas internacionais, os naturais “chamarizes” de público. O que é uma constatação, não um juízo de valor nacionalista, bem longe disso.
Mas aí, em 2014, num período de pleno renascimento da música brasileira como um produto “vendável” em muitos sentidos, o Coala Festival surgiu para subverter toda uma cultura e colocar a música brasileira no holofote principal. Num ponto imbatível: ele passava a acontecer em São Paulo, a principal praça brasileira. Aí o bicho pegou.
Acontecendo neste final de semana no Memorial da América Latina, na Barra Funda, em sua oitava edição, em três dias de evento, o Coala Festival se desafia a cada ano a construir um line-up mais diverso e surpreendente para continuar fortalecendo a música brasileira. Como resultado, eles acabam sendo referência para os muitos festivais só com MPB que já dominam o calendário de shows brasileiro de Norte a Sul e continuam surgindo pelo País, reflexo da crescente onda de música brasileira dos últimos anos e fortalecimento da via de festivais que começou lá atrás, na cena independente. Isso graças às novas vias de comunicação e sem quase nenhum respaldo de TVs e rádios, tirando algumas poucas iniciativas isoladas, mas superconectadas.
A Popload conversou com Gabriel Andrade, 32 anos, curador do Coala e um de seus sócios-fundadores, que posicionou o festival, hoje uma “marca de música”, em meio a essa renascença cada vez mais notável da música brasileira.
* A missão do Coala Festival – “O papel do Coala enquanto festival é trazer visibilidade e formar público para essa grande onda nova brasileira. Estamos passando por um momento histórico, por uma transição do que ficou conhecido como a música brasileira do século XX e o que vai ser conhecido como a música brasileira do século XXI. A gente se posiciona nesse lugar de reverenciar os artistas que formaram o imaginário popular do que é a música brasileira e de abrir caminhos para a geração que vai levar esse legado adiante. Nosso papel é fortalecer não só essa cena, mas também um mercado que possibilite a sua existência de forma sustentável”.
* Sobre o começo de tudo – “Sinceramente, nós não tínhamos o mínimo conhecimento do mercado de música do Brasil e muito menos sobre os festivais independentes quando resolvemos nos meter nessa. A ideia de fazer o festival surgiu da paixão pela música, da perspectiva de entusiastas dessa cena e não da percepção de que existia um gap no mercado. Até porque eu tinha 22 anos na época, assim como meu sócio Guilherme, ambos na faculdade, ambos do interior e com pouquíssima noção do mercado”.
* A edição 2022 do festival – “Esta edição é o reencontro depois de 3 anos, é mais um passo em direção à nossa missão de fortalecer o ecossistema da música brasileira e é o ápice do festival. Acompanhando a montagem nestes dias, passou um filme na minha cabeça e, honestamente, mesmo sabendo de tudo que seria feito, eu fiquei impressionado com a estrutura do festival. Fizemos muitos movimentos durante essa trajetória, mas 2022 é o maior deles: 3 dias, 2 palcos, ocupando quase a totalidade do Memorial da América Latina, expectativa de 17 mil pessoas por dia, transmitido ao vivo e com um line-up histórico. Além disso, quem for ao Coala neste ano verá o amadurecimento do festival, da identidade que vem sendo construída se afirmar ainda mais, a direção de arte ainda mais refinada, o palco ainda mais sofisticado, o som mais regulado, a experiência mais redonda. Enfim, estávamos muito ansiosos para apresentar o Coala pós-pandêmico ao nosso público. Espero que seja tão impactante para o público quanto foi para mim ao ver o festival montado para esta edição”.
* Coala enquanto “marca de música” – “Fortalecer a música brasileira, nossa pretensão, pode ser feito de várias formas e em vários campos de atuação no ecossistema da música. A gente não se enxerga como uma marca de eventos e sim como uma marca de música. E esses movimentos paralelos ao festival são expressões dessa nossa vontade de realmente impactar o ecossistema não só promovendo, mas também criando cultura. Eu sempre falo: posso investir em uma campanha publicitária para reforçar meu posicionamento em música ou posso investir em um disco ou em um clipe. A gente sempre prefere a segunda opção. Nossas outras frentes de atuação, o Coala Lab e o Coala Records, surgiram de iniciativas de construção de marca do festival, mas hoje em dia elas têm vida própria, viraram frentes de negócio e, ainda assim, continuam construindo marca e trazendo mais legitimidade para o festival perante o público, perante os artistas e, consequentemente, perante os patrocinadores”.
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* O Coala Festival 2022 acontece neste final de semana, desde sexta até domingo, no Memorial da América Latina, em São Paulo. Ontem teve Gilberto Gil (foto desta sexta), Djavan e KL Jay como as principais atrações. Hoje apresenta de Ana Frango Elétrico a Gal Costa (com participações especiais de Tim Bernardes e Rubel). Amanhã, domingo, o festival tem como headliner a veterana cantora baiana Maria Bethânia.
** O Coala.tv transmite o festival ao vivo no Youtube. Toda a programação e info do evento podem ser encontradas na conta de Instagram @coalafestival.
*** Este texto foi escrito e editado por Carolina Andreozzi e Lúcio Ribeiro.
*** As fotos deste post são do Instagram de Fernando Yokota, clicadas nesta sexta-feira, o primeiro dos três dias do Coala Festival.
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