Arctic Monkeys, “The Car”- Quem embarcou nesta onda sem-riffs deles ganha um outro ótimo disco

Chegou o grande dia. Saiu “The Car”, o tão esperado sétimo álbum da banda adulta Arctic Monkeys, sequência de quatro anos e meio depois do “divisor de águas para o bem e para o mal” que foi o “Tranquility Base Hotel & Casino”.

É melhor que o anterior? A mesma coisa? Cadê as guitarras? Cadê os riffs, os hits, os hinos? O que está acontecendo com o Arctic Monkeys?

Neste “The Car”, pode-se entrar nele por várias camadas. Então é esse nosso desafio, estamos aqui para isso. O primeiro a pousar aqui seu olhar (e ouvidos) sobre o AM novo é o poploader Fernando Scoczynski Filho. Leia abaixo:


Por Fernando Scoczynski Filho

Mais de quatro anos atrás, o Arctic Monkey lançava “Tranquility Base Hotel & Casino”, um disco conceitual e polêmico, sinalizando uma despedida do som clássico da banda, tipicamente carregado por guitarras. Como comentei aqui mesmo na Popload à época, eu fui (e continuo sendo) um dos maiores fãs da atmosfera de ficção científica de “Tranquility Base”, criando toda uma narrativa em torno de um êxodo da humanidade para uma colônia na Lua – e aquele som mais focado em teclados e baixo se encaixava perfeitamente com as letras.

Pena que pouca gente gostou da mudança, e menos gente ainda entendeu o conceito. Agora, com o lançamento de “The Car”, sétimo disco de estúdio do AM, quem abandonou a banda em 2018 deve continuar sem motivo para voltar. No entanto, quem embarcou para esse novo som anti-riff será recompensado com outro ótimo disco.

Não, não tem riffs de guitarras, não procure nenhum riff. Quem esperava que o AM continuasse sendo uma banda apenas de guitarras para o resto da vida vai se decepcionar (mais uma vez), mas esse ouvinte faria bem em repensar seus conceitos um pouco, ver que o rock (o indie, o pop, tanto faz) vai além disso. Como tantos outros artistas antes deles (vamos citar dois óbvios aqui, cada um em sua época: David Bowie e Radiohead), os Arctic Monkeys reinventaram seu som. Encontraram um jeito diferente de fazer música e conseguiram refiná-lo em “The Car”.

Os singles “There’d Better Be a Mirrorball” e “I Ain’t Quite Where I Think I Am” já davam a deixa do que esperar no restante do disco. Som rico, repleto de camadas, atmosférico. Vocais suaves, batidas tranquilas, muitos teclados. Também tem um acompanhamento orquestral aqui ou ali, marcando a maior e mais positiva novidade em comparação ao álbum anterior. Sim, tem umas guitarras, e mais solos que no trabalho anterior (como os ótimos solos que fecham “Body Paint” e “Big Ideas”). Mas, no geral, é uma continuação do som iniciado em “Tranquility Base”.

Um destaque diferenciado é a terceira faixa, “Sculptures of Anything Goes”, com seu sintetizador pesado e sua instrumentação escassa, resultando em um tom mais sombrio. Soa diferente de tudo em “The Car”, e merece ser lembrada como uma das melhores músicas da carreira da banda. Também indica um caminho mais ousado para o AM que, caso fosse mais explorado em “The Car”, poderia torná-lo mais interessante.

Perto do fim do disco, chegamos ao seu ponto mais fraco: as últimas três faixas acabam caindo numa mesmice, e praticamente passam batidas. Após “Big Ideas”, parece que são justamente as ideias que acabaram. O som refinado e atmosférico continua lá, mas foi mais bem aproveitado nas faixas anteriores. Enquanto “Tranquility Base” mantinha um nível de variedade satisfatório até o fim, “The Car” perde o gás antes de acabar.

Em comparação ao álbum anterior, “The Car” certamente traz melhorias, com um som geralmente mais rico e fácil de se aproveitar. Como um todo, é uma “pena” que a maioria das faixas boas estejam nos singles, deixando pouco para se explorar no restante do disco, agora que ele é por inteiro a novidade. Uma narrativa de ficção científica unificando a obra como um disco conceitual também cairia bem, mas tudo bem.

No fim, é mais um disco bom do AM, que vai acrescentar algumas ótimas musicas aos seus setlists, e só temos a ganhar com isso. Não é uma obra-prima, mas a banda merece crédito por continuar se inovando e fugir do rock previsível.