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* Acho que é o tipo de texto que não cabe taaaaanto aqui, porque o assunto é tratado aqui bastante. E o tipo de leitor que frequenta este espaço deve concordar com tudo. Originalmente, a crítica do primeiro show da banda Rolling Stones em São Paulo foi feito a pedido da Folha de S.Paulo, para ser publicado na internet, para seu público “amplo”. E para esse público amplo foi escrito. É um pensamento-manifesto que alimenta a existência de sites como este. Então, mesmo com cara de deja vù, vale o repeteco aqui, agora. Pelo menos o texto tem uma armadilhazinha. Então, saiba como foi o evento Rolling Stones em SP, na humilde visão deste que vos escreve.
O conceito “Panela velha é que faz comida boa” precisa ser revisto urgentemente no Brasil, com o perdão da referência “batida”. Porque o que se viu quarta-feira à noite no Morumbi, em São Paulo, foi um show com o jeitão de “viagem no tempo”, animado até, mas que de forma gritante carecia de uma energia que naturalmente se perdeu em sua essência, em sua alma: o tal do “teen spirit”.
Se a questão principal hoje na música é mesmo sentir se o rock está morto ou não, ou o “quão morto” está, assunto recorrente em shows assim inclusive aqui na Ilustrada, então não havia melhor hora e lugar para se pensar nisso do que anteontem no “velho” estádio gigantesco da cidade (e não nas suas novas e modernas arenas), cenário acidental ideal para a ocasião, e no qual chuvas fracas e fortes lavavam corações e mentes daquele mundo de gente reunida, capaz de cantar praticamente todas as músicas sem precisar buscar as letras no Google, via celular.
E, então, eis que a banda, nossa velha conhecida, subiu ao palco no horário marcado, britanicamente. Já com a intenção de conquistar de vez o público logo no começo, disparou o primeiro hit clássico dos muitos que viriam a seguir. Muitas memórias.
No hoje bastante discutido “Vinyl”, seriado de TV idealizado, curado e produzido pelo personagem principal da vida real desta noite, o velho Mick Jagger, o personagem principal da série (mais ou menos) ficcional, um executivo chapadão da indústria musical, tem uma visão, uma epifania ao ver uma banda nova. E reclama aos seus sócios donos de gravadora que um novo rumo deveria ser tomado, lááá em 1973 . Mais ou menos assim: “Rock’n’roll é uma baita energia. Rock’n’roll, quando você ouve algo novo, é rápido, sujo, como se você tivesse levando uma porrada na cabeça”.
Daí que, corta para fevereiro de 2016, lá estava a veterana banda correndo a beça no palco, parecendo se divertir e divertir na mesma proporção, procurando mostrar um gás que a idade visivelmente limita, mas que de alguma forma está ali, já que o rock, afinal, vive, sim. É até bonito de ver, porque clássicos são clássicos e vice-versa, é referente de várias coisas, várias vidas. Mas cadê a porrada na cabeça?
E então os Titãs (sim, este texto se refere até aqui, o tempo todo, aos Titãs) terminam seu show protocolar, saem de cena, mais chuva vem e a dispersão pré-atração principal faz o grupo paulistano ser praticamente esquecido depois de seu último riff, da última palma.
Nada contra Titãs e bandas nacionais que têm lá seus clássicos, sua história, mas devia ser criado aqui no Brasil uma Las Vegas particular, sei lá, um circuito mais bem definido qualquer para grupos desse perfil (e idade), porque o rock não está morto, ok, mas precisa estar renovado e em constante mutação, porque senão morre e leva junto tudo o que a ele está ligado: rádios, imprensa, casa de shows cheias, público.
A produção dos Rolling Stones no Brasil, com o jogo ganho porque Stones é Stones, perdeu a boa oportunidade de botar uma ou duas bandas novas como atração de abertura, para contribuir na busca da tal “energia” citada acima, saída da boca do protagonista de “Vinyl”.
Ah, e sobre o show dos Rolling Stones em si, esse foi espetacular, lato sensu, como esperado, como sempre repetido em resenhas desde, sei lá, Altamont 1969. Nenhuma novidade aqui. Setentões superconectados entre si e com sua música que não perderam o “teen spirit” e ainda movem o caminhão de hits inesquecíveis que fizeram e que, alguns deles, ainda hoje, vêm como uma porrada na cabeça. A “Las Vegas” de artistas como os Stones é bem mais ampla.
* Foto da chamada: Manuela Scarpa
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