“Mas, afinal de contas, eles são muçulmanos ou não?”, é o que alguém pode perguntar ao ouvir a primeira faixa e observar a capa de “Attempted Martyr”, disco de estreia da banda Prostitute. Lançado no fim do ano passado, o trabalho vem ganhando atenção na internet por conta de seu som pesado e de influências atípicas, e até ganhou uma nobre nota 8 do cultuado crítico musical Anthony Fantano em seu canal no YouTube.
Respondendo à questão que abre o texto, sim, eles são – os integrantes nasceram em Dearborn, Michigan, conhecida como “a capital árabe dos EUA” e cuja população é majoritariamente muçulmana.
Mas, para responder outras perguntas que surgiram ao ouvir o instigante álbum, decidimos conversar com a própria banda. Falamos com os integrantes Andrew Kaster, Ross Babinksi, Dylan Zaranski, Bret Wall e o vocalista Moe, que opta por não revelar seu sobrenome.
A banda até se esquiva em um momento, mas acaba revelando o suficiente para apreciarmos sua obra.
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Popload: De onde vocês são?
Moe: Somos todos de Dearborn, Michigan. É uma cidade pequena, predominantemente árabe. É tipo a capital árabe dos EUA.
Popload: E como a banda começou?
Andrew: Moe e eu tentamos fazer uma banda há muitos anos. Ele costumava fazer música eletrônica e ambiente, mas acabou gostando de rock e fazendo um rock meio estilo “terror”. No outono de 2019, Moe conversou comigo e com Dylan em um restaurante e nos deu um ultimato: “Vocês querem ficar infelizes pelo resto de suas vidas ou montarem uma banda?” Mas aí veio a Covid e atrasou tudo.
Popload: Então vocês já têm as músicas do disco “Attempted Martyr” há um bom tempo?
Moe: Sim, faz uns quatro anos. E gravamos com dois engenheiros diferentes antes de acharmos o certo para o disco, então o que foi lançado já é a terceira versão dele.
Popload: E quais são as principais influências musicais de vocês?
Moe: Todos crescemos ouvindo rock, incluindo outras coisas. Eu cresci tocando piano, mas foi só com 20 e poucos anos que eu ouvi umas coisas tipo Daughters e Swans, e aí quis fazer música agressiva. Eu adorava trilhas sonoras de filmes de terror, como “O Iluminado”, mas sentia que o terror era uma emoção pouco representada no rock. Não fomos necessariamente influenciados pelo Daughters, porque já tínhamos esse conceito antes do lançamento de “You Won’t Get What You Want” [lançado pelo Daughters em 2018], mas ouvimos aquilo e pensamos, “É esse som que queremos fazer”. Só que eles já faziam bem melhor [risos].
Popload: E o que está acontecendo na primeira faixa do seu disco?Moe: [Risos] Não posso te contar ainda. Algum dia contarei. De onde você é, Fernando?
Popload: Do Brasil.
Moe: Adoraríamos tocar no Brasil. Amo o Brasil. Nos leve aí! Você já entrevistou a Ana Frango Elétrico?
Popload: Ainda não tive a oportunidade. Vocês gostam dela?
Moe: Sim, amo. Também o Lô Borges…
Dylan: Aquele cara com a capa toda viajada, Jorge Ben.
Moe: Qualquer coisa que sai do Brasil é incrível.
Dylan: Cartola também.
Moe: Nenhum americano conseguiria ser o Cartola.
Popload: Mas, voltando ao assunto, tem alguns trechos do disco que claramente não foram gravados por vocês. Tipo no fim da faixa “Judge”, parece que tem um áudio de Whatsapp de alguém descrevendo uma situação assustadora em Barcelona. É da época da pandemia?
Moe: É uma mensagem do meu tio logo após a pandemia. Mas não sei se deveríamos revelar isso, porque muita gente escuta essa parte e acha que tem a ver com um ataque terrorista em Barcelona. [Risos] Mas ele é do Líbano, tenho muitos parentes de lá que migraram para outros países.
Popload: E a primeira faixa é uma introdução chocante. Claramente não é sua voz. Provavelmente será o primeiro contato que e a maioria dos ouvintes terá com seu som. Por que vocês escolheram começar o disco com isso?
Moe: Andrew, como você descreveria a faixa?
Andrew: Esteticamente, é uma boa abertura. Queríamos que o disco tivesse uma atmosfera cinematográfica, que cada faixa fosse sua própria história. [Pausa] É uma espécie de oração, pedindo misericórdia, geralmente feita durante momentos desesperados. Gosto de ter começado o disco assim, com uma linda oração, e logo em seguida entrar em uma situação violenta com reféns. A narrativa que você criar na sua cabeça com isso fica por sua conta.
Popload: Algumas bandas, como o System of a Down, são óbvias, diretas com sua mensagem política. Vocês têm a intenção de deixar sua mensagem tão claras?
Moe: Na minha opinião, sim, é algo que eu quero. Mas acho que muita gente ainda não entendeu, então penso em ser ainda mais direto no próximo álbum. Falamos sobre extremismo religioso, o que está acontecendo no Líbano e em outros lugares do mundo… sinto que muita gente quer músicas que falem sobre isso.
Popload: E o nome da banda é Prostitute. Que ideia foi essa?
Andrew: Moe sugeriu o nome, e eu consegui imaginá-lo com um logo legal. Quanto mais tempo passamos com esse nome, mais me apego a ele e mais tenho que explicá-lo. O que eu digo agora, é que é um verbo. “Prostituir”. O que fazemos para tentar largar nossos empregos [Risos].
Moe: Mas dê aquele outro significado legal também.
Andrew: Observando o sentido religioso de algumas canções, outro sentido seria a noção de “abrir mão de seu corpo em prol de algo melhor”. Isso vale também para o título do álbum [“Attempted Martyr”]. Mas queremos deixar ambiguidade pelo meio.
Popload: Acho engraçado que o nome “Prostitute” não é necessariamente um palavrão, então não precisa ser censurado, mas alguns festivais talvez não o queiram em seus pôsteres.
Moe: Quando estávamos prestes a lançar o álbum, eu sabia que era quase um suicídio profissional manter o nome, mas todos concordamos. Talvez não seja o nome mais lucrativo do mundo. Não podemos nem usar o nome para nosso perfil no Instagram.
Dylan: Se você tentar buscar nossas músicas para usar no TikTok, aparece uma mensagem automática: “Você não deveria estar procurando isso”.
Popload: Quando o Anthony Fantano postou a resenha de seu disco, vocês perceberam uma diferença na quantidade de acessos a sua música?
Moe: Sem dúvida, foi uma loucura. Ainda estamos recebendo muitos seguidores. Nossa contagem de ouvintes foi de 800 por mês para cerca de 30.000. Na verdade, todos nós assistimos ao canal do Fantano há anos, e estávamos imaginando se ele postaria algo sobre nosso disco. Mas eu vi o vídeo no mesmo instante que ele postou e liguei para o Dylan na hora.
Popload: E uma nota 8 dele é muito boa.
Moe: Sim, e concordamos até com as críticas dele. O próximo disco será muito melhor.